Descobri que a tristeza não termina completamente dentro de nós.
Fica em algum lugar do nosso corpo somatizada como uma dorzinha boba, mas fica principalmente em nosso rosto como uma expressão que não tínhamos antes, como uma sombra que aparece quando ouvimos uma música, uma frase, sentimos um perfume...
Sem as tristezas (decepções, perdas...) eu não seria como sou, seria outra.
Teria um outro rosto que não este.
Como as mudanças são lentas e vamos nos acostumando com elas, sei lá se me reconheceria ao me olhar no espelho, assim de repente, depois de algum tempo.
Não estou falando de rugas, do brilho da pele, da juventude, este doce pássaro que passa rapidamente em nossas vidas. Estou falando de tristeza, como poderia estar falando de alegria. Não estou.
Nem sempre percebemos quando a tristeza se instala dentro de nós como um desconforto, um mal-estar sem motivo, uma insônia prolongada.
Racionalizamos:
- Passou, acabou, foi embora, morreu e vou ter que conviver com isso.
- Perdi o emprego, não passei no concurso, alguém me humilhou em público.
Já passou...
Tentamos continuar em frente sem vivenciar o luto que deveria ser vivenciado até que a tristeza se tornasse mais suave e nos deixasse mais fortes.
Não estou triste. Não sou triste. Fujo da tristeza feita uma idiota, como se isso fosse possível, mas as tristezas que tive não passaram por mim em vão, tornaram-me mais forte.
Fui até o espelho. Eu vejo, como sempre, os olhos de meu pai refletido nos meus olhos. Ele continua vivo em mim.
Sorrio para ele, mas o sorriso duplicado me faz pensar que não sei a sua origem, não sei de quem herdei o meu sorriso, mas vejo-o muitas vezes em minha filha.
Juro que pretendia escrever sobre a tristeza, mas termino com o sorriso luminoso de minha filha Ana e seu sonoro gargalhar, música divina.
Nédier