terça-feira, 27 de julho de 2010

Como os EUA financiaram mais de 150 jornalistas contra Chávez

Foto: Alejandro Rustom/Reuters
Apoiadores de Hugo Chávez comemoram vitória no referendo ao lado de cartaz do líder venezuelano
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Como os EUA financiaram mais de 150 jornalistas contra Chávez

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Documentos recentemente desclassificados do Departamento de Estado dos Estados Unidos através da Lei de Acesso à Informação (FOIA, por suas siglas em inglês) evidenciam mais de US$ 4 milhões em financiamento a meios e jornalistas venezuelanos durante os últimos anos.
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O financiamento tem sido canalizado diretamente do Departamento de Estado através de três entidades públicas estadunidenses: a Fundação Panamericana para o Desenvolvimento (PADF, por suas siglas em inglês), Freedom House e pela Agência de Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (Usaid).
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Em uma tosca tentativa de esconder suas ações, o Departamento de Estado censurou a maioria dos nomes das organizações e dos jornalistas recebendo esses fundos multimilionários. No entanto, um documento datado de julho de 2008 deixou sem censura os nomes das principais organizações venezuelanas recebendo os fundos: Espaço Público e Instituto de Imprensa e Sociedade (IPYS).
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Espaço Público e IPYS são as entidades que figuram como as encarregadas de coordenar a distribuição dos fundos e os projetos do Departamento de Estado com os meios de comunicação privados e jornalistas venezuelanos.
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Os documentos evidenciam que a PADF, o FUPAD, em espanhol, implementou programas na Venezuela dedicados à "promoção da liberdade dos meios e das instituições democráticas", além de cursos de formação para jornalistas e o desenvolvimento de novos meios na Internet devido ao que considera as "constantes ameaças contra a liberdade de expressão" e "o clima de intimidação e censura contra os jornalistas e meios".
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Financiamento a páginas web anti-Chávez
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Um dos programas da Fupad, pelo qual recebeu US$ 699.996 do Departamento de Estado, em 2007, foi dedicado ao "desenvolvimento dos meios independentes na Venezuela" e para o jornalismo "via tecnologias inovadoras". Os documentos evidenciam que mais de 150 jornalistas foram capacitados e treinados pelas agências estadunidenses e 25 páginas web foram financiadas na Venezuela com dinheiro estrangeiro. Espaço Público e IPYS foram os principais executores desse projeto em âmbito nacional, que também incluiu a outorga de "prêmios" de 25 mil dólares a vários jornalistas.
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Durante os últimos dois anos, aconteceu uma verdadeira proliferação de páginas web, blogs e membros do Twitter e do Facebook na Venezuela que utilizam esses meios para promover mensagens contra o governo venezuelano e o presidente Chávez e que tentam distorcer e manipular a realidade sobre o que acontece no país.
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Outros programas manejados pelo Departamento de Estado selecionaram jovens venezuelanos para receber treinamento e capacitação no uso dessas tecnologias e para criar o que chamam uma "rede de ciberdissidentes" na Venezuela.
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Por exemplo, em abril deste ano, o Instituto George W. Bush, juntamente com a organização estadunidense Freedom House, convocou um encontro de "ativistas pela liberdade e pelos direitos humanos" e "especialistas em Internet" para analisar o "movimento global de ciberdissidentes". Ao encontro, que foi realizado em Dallas, Texas, foi convidado Rodrigo Diamanti, da organização Futuro Presente da Venezuela.
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No ano passado, durante os dias 15 e 16 de outubro, a Cidade do México foi a sede da 2ª Cúpula da Aliança de Movimentos Juvenis ("AYM", por suas siglas em inglês). Patrocinado pelo Departamento de Estado, o evento contou com a participação da Secretária De Estado Hillary Clinton e vários "delegados" convidados pela diplomacia estadunidense, incluindo aos venezuelanos Yon Goicochea (da organização venezuelana Primero Justicia); o dirigente da organização Venezuela de Primera, Rafael Delgado; e a ex-dirigente estudantil Geraldine Álvarez, agora membro da Fundação Futuro Presente, organização criada por Yon Goicochea com financiamento do Instituto Cato, dos EUA.
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Junto a representantes das agências de Washington, como Freedom House, o Instituto Republicano Internacional, o Banco Mundial e o Departamento de Estado, os jovens convidados receberam cursos de "capacitação e formação" dos funcionários estadunidenses e dos criadores de tecnologias como Twitter, Facebook, MySpace, Flicker e Youtube.
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Financiamento a universidades

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Os documentos desclassificados também revelam um financiamento de US$ 716.346 via organização estadunidense Freedom House, em 2008, para um projeto de 18 meses dedicado a "fortalecer os meios independentes na Venezuela". Esse financiamento através da Freedom House também resultou na criação de "um centro de recursos para jornalistas" em uma universidade venezuelana não especificada no relatório. Segundo o documento oficial, "O centro desenvolverá uma rádio comunitária, uma página web e cursos de formação", todos financiados pelas agências de Washington.

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Outros US$ 706.998 canalizados pela Fupad foram destinados para "promover a liberdade de expressão na Venezuela", através de um projeto de dois anos orientado ao jornalismo investigativo e "às novas tecnologias", como Twitter, Internet, Facebook e Youtube, entre outras. "Especificamente, a Fupad e seu sócio local capacitarão e apoiarão [a jornalistas, meios e ONGs] no uso das novas tecnologias midiáticas em várias regiões da Venezuela".

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"A Fupad conduzirá cursos de formação sobre os conceitos do jornalismo investigativo e os métodos para fortalecer a qualidade da informação independente disponível na Venezuela. Esses cursos serão desenvolvidos e incorporados no currículo universitário".

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Outro documento evidencia que três universidades venezuelanas, a Universidade Central da Venezuela, a Universidade Metropolitana e a Universidade Santa Maria, incorporaram cursos sobre jornalismo de pós-graduação e em nível universitário em seus planos de estudos, financiados pela Fupad e pelo Departamento de Estado. Essas três universidades têm sido os focos principais dos movimentos estudantis antichavistas durante os últimos três anos.

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Sendo o principal canal dos fundos do Departamento de Estado aos meios privados e jornais na Venezuela, a Fupad também recebeu US$ 545.804 para um programa intitulado "Venezuela: As vozes do futuro". Esse projeto, que durou um ano, foi dedicado a "desenvolver uma nova geração de jornalistas independentes através do uso das novas tecnologias". Também a Fupad financiou vários blogs, jornais, rádios e televisões em regiões por todo o país para assegurar a publicação dos artigos e transmissões dos "participantes" do programa.

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A Usaid e a Fupad

Mais fundos foram distribuídos através do escritório da Usaid em Caracas, que maneja um orçamento anual entre US$ 5 milhões e US$ 7 milhões. Esses milhões fazem parte dos 40 a US$ 50 milhões que anualmente as agências estadunidenses, europeias e canadenses estão dando aos setores antichavistas na Venezuela.

A Fundação Panamericana para o Desenvolvimento está ativa na Venezuela desde 2005, sendo uma das principais contratistas da Usaid no país sulamericano. A Fupad é uma entidade criada pelo Departamento de Estado em 1962, e é "filiada" à organização de Estados Americanos (OEA). A Fupad implementou programas financiados pela Usaid, pelo Departamento de Estado e outros financiadores internacionais para "promover a democracia" e "fortalecer a sociedade civil" na América Latina e Caribe.

Atualmente, a Fupad maneja programas através da Usaid com fundos acima de US$ 100 milhões na Colômbia, como parte do Plano Colômbia, financiando "iniciativas" na zona indígena em El Alto; e leva dez anos trabalhando em Cuba, de forma "clandestina", para fomentar uma "sociedade civil independente" para "acelerar uma transição à democracia".

Na Venezuela, a Fupad tem trabalhado para "fortalecer os grupos locais da sociedade civil". Segundo um dos documentos desclassificados, a Fupad "tem sido um dos poucos grupos internacionais que tem podido outorgar financiamento significativo e assistência técnica a ONGs venezuelanas".

Os "sócios" venezuelanos

Espaço Público é uma associação civil venezuelana dirigida pelo jornalista venezuelano Carlos Correa. Apesar de sua página web (www.espaciopublic.org) destacar que a organização é "independente e autônoma de organizações internacionais ou de governos", os documentos do Departamento de Estado evidenciam que recebe um financiamento multimilionário do governo dos Estados Unidos. E tal como esses documentos revelam, as agências estadunidenses, como a Fupad, não somente financiam grupos como o Espaço Público, mas os consideram como seus "sócios" e desde Washington lhes enviam materiais, linhas de ação e diretrizes que são aplicadas na Venezuela, e exercem um controle sobre suas operações para assegurar que cumprem com a agenda dos Estados Unidos.

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O Instituto de Imprensa e Sociedade (IPYS) é nada mais do que um porta-voz de Washington, criado e financiado pelo National Endowment for Democracy (NED) e por outras entidades conectadas com o Departamento de Estado. Seu diretor na Venezuela é o jornalista Ewald Sharfenberg, conhecido opositor do governo de Hugo Chávez. IPYS é membro da agrupação Intercâmbio Internacional de Livre Expressão (IFEX), financiado pelo Departamento de Estado e é parte da Rede de Repórteres Sem Fronteiras (RSF), organização francesa financiada pela NED, pelo Instituto Republicano Internacional (IRI) e pelo Comitê para a Assistência para uma Cuba Livre.

Fonte:
Diário Liberdade

23/7/2010

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Trabalho escravo resiste também no Sul e no Sudeste



Marcos de Moura e Souza, de Palmas/PR e São Paulo


Num barracão de 11 metros por 3 metros, sujo e improvisado, 19 beliches estão amontoados da entrada até os fundos. Há apenas duas janelas e uma porta de compensado de madeira numa das extremidades. Mesmo durante o dia, o ambiente fica na penumbra. O telhado é de zinco. Não há luz elétrica, banheiro ou qualquer tipo de aquecimento. No inverno, as temperaturas chegam quase a zero grau. Banhos são num vão de terra a céu aberto onde escorre um fio d'água gelada ou num quadrado improvisado com lona e sem porta. À noite, como não há colchões para todos, alguns dividem a mesma cama. Pelo menos dois adolescentes dormem com adultos.

Foi assim que integrantes do Ministério Público e da Procuradoria Regional do Trabalho do Paraná encontraram, no início deste mês, um alojamento de trabalhadores rurais contratados para podar uma plantação de pinheiros pinus numa fazenda na cidade de Palmas, no sudoeste do Paraná.

A área pertence à Madepar S.A. Indústria e Comércio (cujo nome fantasia é Madepar Agroflorestal). Ela integra um grupo ao qual pertencem a Madepar Papéis para Embalagem e a Madepar Laminados, todas sediadas no mesmo endereço na cidade de São Paulo.

Nos dias 8 e 9, uma equipe formada por auditores do trabalho, um procurador e policiais federais entraram nas fazendas da Madepar Agroflorestal em Palmas e autuaram a empresa por exploração de trabalho em condições análogas à escravidão. A operação se estendeu até sexta-feira passada. O Valor acompanhou os dois primeiros dias dos trabalhos a convite do Ministério do Trabalho e Emprego e da Procuradoria Regional do Trabalho do Paraná e se comprometeu a publicar a reportagem somente após o término da blitz.

Depois de anos registrando casos de trabalho análogo à escravidão quase exclusivamente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, autoridades passaram a intensificar suas ações em regiões onde até então havia poucos registros da prática. No ano passado, pela primeira vez desde 1995, a região Sudeste teve o maior número de resgatados - 1.079 casos de um total de 3.769 em todo o país. No Sul, o Paraná foi o principal alvo, com 15 operações realizadas no ano passado (ficando atrás só do Pará e do Mato Grosso).

"Sempre houve trabalho escravo aqui no Paraná, no Rio Grande do Sul, em São Paulo, no Rio. A questão é que o foco da fiscalização foi por muito tempo o Amazonas, Pará, Tocantins, Maranhão e áreas onde havia incidência mais visível dessa prática", diz Luercy Lino Lopes, procurador da Procuradoria Regional do Trabalho do Paraná, que participou da ação na área da Madepar. "Há alguns anos começamos a nos dar conta que a realidade daqui é a mesma da do Pará." Lá, carvoarias costumam estar no centro das irregularidades; no Paraná, erva-mate e madeira.

O que contribuiu para ampliar o alcance das ações e redirecionar os olhos das autoridades foi a alteração do Artigo 149 do Código Penal pela Lei 10.803, de 2003. A lei detalhou quatro condutas que, juntas ou isoladamente, passaram a configurar trabalho análogo à escravidão. São elas: submeter o trabalhador a trabalhos forçados, submeter o trabalhador à jornada exaustiva, sujeitar o trabalhador a condições degradantes de trabalho e restringir a locomoção do trabalhador em razão de dívida para com o empregador ou preposto. Antes da lei, o conceito de escravidão no Brasil levava em conta apenas os casos de trabalho forçado e escravidão por dívida.

"Com esse alargamento do conceito, não ficamos mais presos nos casos da Amazônia e do Norte, onde havia muita servidão por dívida e trabalho forçado, e onde dependíamos fundamentalmente de denúncias", diz Marcelo Campos, auditor fiscal do trabalho e assessor da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego. "Isso permitiu que fôssemos atrás de outras regiões e de outras atividades econômicas."

Foi assim que autoridades passaram a fazer blitze em plantios de café, de morango e de uva, em áreas de colheita de erva-mate e nas fazendas do setor sucroalcooleiro no Sul e no Sudeste. Em 2002, um ano antes da aprovação da lei, o ministério não havia feito nenhuma operação nos Estados do Sul; em 2009 foram 24. No Sudeste, o salto foi de 1 para 18. Em todo o Brasil, o número de operações saiu de 30 para 156. O número de resgatados subiu de 2.285 para 3.769. Em 1995, quando o ministério começou a rastrear o trabalho escravo, apenas 84 pessoas foram retiradas da condição de escravo.

Nos últimos anos, o traço em comum na maioria das autuações passou a ser a degradação. "No ano passado, encontramos em Bituruna, aqui no Paraná, trabalhadores contratados para colher erva-mate alojados num curral. No mês passado, em Santa Catarina, encontramos outro grupo, que dormia num chiqueiro de porcos", lembra a auditora fiscal do trabalho Luize Surkamp Neves, coordenadora do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, que combate trabalho escravo na região Sul. Foi ela quem liderou a operação em Palmas.

Segundo Campos, a situação de degradação - junto ou não com outras condutas previstas no Artigo 149 - aparece em todas as mais de 45 condenações de empregadores julgados pela prática de trabalho escravo no Brasil. As condenações decorrem das ações de fiscalização. Além das autuações administrativas, as operações também podem gerar ações penais aos empregadores. Explorar trabalho escravo é crime punível com pena de dois a oito anos de prisão.

No caso das fazendas da Madepar, além de alojamentos classificados pelos auditores como impróprios, o que a equipe encontrou foram trabalhadores sem equipamento de proteção, dizendo que tinham de pagar para obter ferramentas e providenciar colchões; fornecimento de água com potabilidade duvidosa; falta de banheiros; trabalhadores sem registro em carteira; e, além disso, cinco menores fazendo um tipo de trabalho proibido para sua idade.

"Há uns quatro anos trabalho com pinus, mas esse é o pior lugar que já fiquei", diz Rodrigo Almeida, de 19 anos. Ele tinha começado a trabalhar dois dias antes da operação e estava alojado no barracão improvisado de madeira. Outros dormiam em um contêiner com beliches. "Tinham me falado que tinha alojamento, só não disseram como era." Mario, 27 anos, completa: "O pior é o 'apertamento' e a falta de luz." Contratados por um dos intermediadores de mão de obra da região, Rodrigo e Mário disseram que ganhariam R$ 32 por dia para uma temporada de 15 dias, sem registro em carteira e sem equipamentos de trabalho. "Comprei bota, coberta, prato, garfo, faca. Capacete e luva a gente não usa", conta Rodrigo.

As irregularidades nas fazendas criaram um quadro considerado pelas autoridades como degradante. Além de serem obrigados a pagar multas e encargos, os empregadores podem ter o nome incluído, por no mínimo dois anos, na lista de exploradores de trabalho escravo organizada pelo ministério. Isso pode levar a uma suspensão total de crédito público e privado no período. E implica o risco de perder contratos com empresas signatárias do Pacto para a Erradicação do Trabalho Escravo.

Ao todo, as blitze na Madepar resgataram 67 trabalhadores, entre eles cinco adolescentes. Parte deles trabalhava na manutenção dos plantios de pinus e parte na colheita de erva-mate. A empresa teve de pagar R$ 108.609,99 em verbas rescisórias; R$ 169.000,00 em indenizações por danos morais (de R$ 1.000 a R$ 5.000 para cada um) e R$ 240.000,00 por dano moral coletivo. Com o pagamento do FGTS, dos valores devidos à Previdência e multas pelos 55 autos de infração lavrados, os valores poderão passar de R$ 650 mil, disse Lino Lopes. Parte disso foi pago em dinheiro na dia 23 aos resgatados no escritório da empresa na cidade de General Carneiro, Paraná.

Se não aceitasse fazer o pagamento e recorresse à Justiça, a Madepar correria o risco de ter seus bens congelados no valor da cobrança e ver a conta final multiplicada. Segundo o Ministério do Trabalho e a procuradoria, a maioria dos empregadores autuados por sujeitar trabalhadores à condição análoga opta por acertar as contas durante as autuações.

As condições dos trabalhadores resgatados nas fazendas da Madepar não são muito diferentes das existentes em outras áreas rurais flagradas na região, segundo os auditores. Entre as semelhanças está a terceirização de mão de obra. A empresa, segundo seu advogado Gilberto Dil Prá, estava trabalhando com três ou quatro empreiteiros - termo usado no Paraná e em Santa Catarina para agenciadores ou intermediadores de mão de obra. A prática no meio rural, segundo o ministério, é proibida por lei de 1973, mantida pela Constituição de 1988.

"No Brasil, o trabalho escravo está associado à intermediação de mão de obra e no Sul isso se vê em quase todos os flagrantes. E a intermediação vem acompanhada em 100% das vezes de precarização", diz Lino Lopes. Para Campos, do Ministério, a solução está em mudar o comportamento do empregador. "Ele precisa ter certeza de que esta prática não é um bom negócio." Para o governo e grupos de direitos humanos, uma mudança crucial está na Câmara dos Deputados. O projeto de emenda constitucional (PEC) 438 prevê a expropriação e destinação para reforma agrária de toda área rural flagrada com mão de obra escrava. O projeto já passou pelo Senado.

Valor, 26.07.2010


sábado, 24 de julho de 2010

Desconsolo - para a Regina e o Lindomar

Eu e a Regina na chácara.
Entrando em campo nos primeiros minutos de um janeiro do século passado
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Venho repetindo há anos a poesia do Drumonnd “Consolo de Praia”. http://meunomeenedier.blogspot.com/2010/07/consolo-de-praia-carlos-drummond-de.html
Quando a li pela primeira vez - e me encantei - eu vivia tempos de consolar os infelizes e não sentia este friozinho de desconsolo gelando meu peito, meu coração, minha alma e tudo mais que represente calor humano.
Hoje, relendo-a vejo que mudei e a poesia permanece a mesma. Resolvi então adaptá-la. Para cair na real.


Desconsolo

Chore...
a infância e a mocidade estão perdidas

e a vida se perdeu no meio da perda:
dos amores, dos amigos e de muitas ilusões


O primeiro, o segundo, o terceiro, o quarto,
sei lá quantos amores passaram,

mas o coração continua...

... como um objeto estranho,
cheio de agulhas colocado no meio do peito
no lugar do original.
Um transplante diariamente rejeitado
Dói.


Perdi muitos amigos, os melhores amigos.

(...) Mas tenho um cão.
Que não senta no botequim comigo,
não joga conversa fora, não enche a cara,
não dedilha um violão, nem inventa modas,
não entra em rolos e não pede nada
e ajuda,

sem perguntar nada, quando você precisa
enterrar os teus cadáveres.
mas também ensina a perdoar e a reagir.


E quando você não tem coragem,
ele te dá coragem
para enfiar a mão na cara
de alguém que merece apanhar

e fica sentado ao teu lado na delegacia,
dividindo o último cigarro.

O cão te obedece, te ama à sua forma,
é um companheiro,

perdi muitos, sofri.

Mas os amigos que partiram
levaram junto com eles
pedaços de mim,
o meu melhor sorriso,
as mais lindas lágrimas
e o amor por eles que era meu.

Era meu. Era só meu e não é mais.
Falta o abraço, a voz, a cumplicidade,

a certeza absoluta
De que eu nunca estaria só.

De que eu podia ser feliz na hora que quisesse,
era só chamá-los, e tê-los ao meu lado

Como é dolorida esta certeza
desta felicidade que não voltará

(...)

A injustiça não se resolve
à sombra de um mundo errado.


(- Qual seria o mundo certo?
Não me venham com paz, ecologia
e outras utopias enganosas.
O negócio é vender armas, é cortar árvores,
Poluir os rios.
É acabar com o oxigênio.
É faturar muito e ficar rico e famoso.)

Murmurei protestos tímidos,
tão tímidos que ninguém ouviu.
Não virá mais ninguém. Melhor assim.

Tudo somado, eu devia

me atirar de vez, nas águas...
mas penso que é melhor chorar.

- principalmente porque eu sei nadar.

Nédier

Consolo de Praia - Carlos Drummond de Andrade

Matinhos/PR

Consolo na praia


Vamos, não chores.

A infância está perdida.

A mocidade está perdida.

Mas a vida não se perdeu.

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O primeiro amor passou.

O segundo amor passou.

O terceiro amor passou.

Mas o coração continua.

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Perdeste o melhor amigo.

Não tentaste qualquer viagem.

Não possuis carro, navio, terra.

Mas tens um cão.

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Algumas palavras duras,

em voz mansa, te golpearam.

Nunca, nunca cicatrizam.

Mas, e o humour?

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A injustiça não se resolve.

À sombra do mundo errado

murmuraste um protesto tímido.

Mas virão outros.

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Tudo somado, devias

precipitar-te, de vez, nas águas.

Estás nu na areia, no vento...

Dorme, meu filho.

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Carlos Drummond de Andrade


segunda-feira, 5 de julho de 2010

Clarice, para a minha amiga Didi


Não entendo.
Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender.
Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras.
Sinto que sou muito mais completa quando não entendo.
Não entender, do modo como falo, é um dom.
Não entender, mas não como um simples de espírito.
O bom é ser inteligente e não entender.
É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida.
É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice.
Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco.
Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.
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Clarice Lispector

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Brasil X Holanda - fotos da família em frente à TV

À laranja mecânica holandesa todos os méritos!!

Meus amigos,


Era para ser uma sexta-feira de alegrias no futebol brasileiro

mas a alegria da esperança

foi aos poucos se esvaindo

até

acabar!!
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As fotos que comprovam:
Nosso neto João, ou Juan, como se rebatizou, foi o nosso guru desta Copa!!
Acertou todos os resultados...
Ontem, convicto:
- Vó, o Brasil amanhã volta pra casa!!

João/Juan no colo do bem-amado tio Dani que é espanhol,
mas torceu para o Brasil...hoje.
Apesar da cara do avô e do sorriso forçado do pai,
o grito de guerra Juan é agora:
- ARGENTINA!!!
Era para ser um almoço festivo
O Pedro, o que não gosta de futebol.