quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Os telegramas do Wikileaks...

O fundador do site Wikileaks, Julian Assange






Os telegramas do Wikileaks, a mídia e o MST
23 de dezembro de 2010

Por Igor Fuser - Jornalista e professor
*Especial para a Página do MST
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Os jornais brasileiros divulgaram na semana passada referências ao MST feitas em telegramas sigilosos enviados nos últimos anos por diplomatas estadunidenses no Brasil aos seus superiores em Washington e revelados pela rede Wikileaks. Algumas reflexões podem ser feitas a partir da leitura desse material.
1. A imprensa empresarial brasileira manteve nesse episódio sua habitual postura de hostilidade sistemática ao MST, apresentado sempre por um viés negativo, e sem direito a apresentar o seu ponto de vista. Para os jornais das grandes famílias que controlam a informação no país, como os Marinho e os Frias, o acesso a vazamentos da correspondência diplomática representou a chance de lançar um novo ataque à imagem do MST, sob o disfarce da objetividade jornalística. Afinal, para todos os efeitos, não seriam eles, os jornalistas, os responsáveis pelo conteúdo veiculado, e sim os autores dos telegramas.
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Desrespeitou-se assim, mais uma vez, um princípio elementar da ética jornalística, que obriga os veículos de comunicação a conceder espaço a todas as partes envolvidas sempre que estão em jogo acusações ou temas controvertidos. Uma postura jornalística honesta, voltada para a busca da verdade, exigiria que O Globo, a Folha e o Estadão mobilizassem seus repórteres para investigar as acusações que diplomatas dos EUA no Brasil transmitiram aos seus superiores. Em certos casos, nem seria necessário deslocar um repórter até o local dos fatos. Nem mesmo dar um telefonema ou sequer pesquisar os arquivos. Qualquer jornalista minimamente informado sobre os conflitos agrários está careca de saber que os assentados no Pontal do Paranapanema mencionados em um dos telegramas não possuem qualquer vínculo com o MST. Ou seja, os jornais que escreveram sobre o assunto estão perfeitamente informados de que o grupo ao qual um diplomata estadunidense atribui o aluguel de lotes de assentamento para o agronegócio não é o MST. O diplomata está enganado ou agiu de má fé. E os jornais foram desonestos ao omitirem essa informação essencial.
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Esse é apenas um exemplo, revelador da postura antiética da imprensa em todo o episódio. Se os vazamentos do Wikileaks mencionassem algum grande empresário brasileiro, ele seria, evidentemente, consultado pela imprensa, antes da publicação, e sua versão ganharia grande destaque. Já com o MST os jornais deixam de lado qualquer consideração ética
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2. A cobertura da mídia ignora o que os telegramas revelam de mais relevante: a preocupação das autoridades estadunidenses com os movimentos sociais no Brasil (e, por extensão, na América Latina como um todo). Os diplomatas gringos se comportam, no Brasil do século XXI, do mesmo modo que os agentes coloniais do finado Império Britânico, sempre alertas perante o menor sinal de rebeldia dos “nativos” nos territórios sob o seu domínio. Nas referidas mensagens, os funcionários se mostram muitos incomodados com a força dos movimentos sociais, e tratam de avaliar seus avanços e recuos, ainda que, muitas vezes, de forma equivocada. O “abril vermelho”, em especial, provoca uma reação de medo entre os agentes de Washington. Talvez por causa da cor... A pergunta é: por que tanta preocupação do império estadunidense com questões que, supostamente, deveriam interessar apenas aos brasileiros?
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3. O fato é que o imperialismo estadunidense é, sim, uma parte envolvida nos conflitos agrários no Brasil. Essa constatação emerge, irrefutável, no telegrama que trata da ocupação de uma fazenda registrada em nome de proprietários estadunidenses em Unaí, Minas Gerais, em 2005. Pouco importa o tamanho da propriedade (70 mil hectares, segundo o embaixador, ou 44 mil, segundo o Incra). O fundamental é que está em curso uma ocupação silenciosa do território rural brasileiro por empresas estrangeiras. Milhões de hectares de terra fértil – segundo alguns cálculos, 3% do território nacional – já estão em mãos de estrangeiros. O empenho do embaixador John Danilovich no caso de Unaí sinaliza a importância desse tema.
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4. Em todas as referências a atores sociais brasileiros, os telegramas deixam muito claro o alinhamento dos EUA com os interesses mais conservadores – os grandes fazendeiros, os grandes empresários dos municípios onde se instalam assentamentos, os juízes mais predispostos a assinarem as ordens de reintegração de posse.
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5. Por fim, o material veiculado pelo Wikileaks fornece pistas sobre o alcance da atuação da embaixada e dos órgãos consulares dos EUA como órgãos de coleta de informações políticas. Evidentemente, essas informações fazem parte do dia-a-dia da atividade diplomática em qualquer lugar no mundo. Mas a história do século XX mostra que, quando se trata dos EUA, a diplomacia muitas vezes funciona apenas como uma fachada para a espionagem e a interferência em assuntos internos de outros países. Aqui mesmo, no Brasil, fomos vítimas dessa postura com o envolvimento de agentes dos EUA (inclusive diplomatas) nos preparativos do golpe militar de 1964. À luz desses antecedentes, notícias como a de que o consulado estadunidense em São Paulo enviou um “assessor econômico” ao interior paulista para investigar a situação dos assentamentos de sem-terra constituem motivos de preocupação. Será essa a conduta correta de um diplomata estrangeiro em um país soberano?
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*Professor da Faculdade Cásper Líbero, doutorando em Ciência Política na USP e membro do conselho editorial do Brasil de Fato.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Bispo emérito de Limoeiro do Norte recusa comenda concedida pelo Senado


O bispo emérito de Limoeiro do Norte (CE), dom Manuel Edmilson da Cruz, 86, recusou a Comenda de Direitos Humanos Dom Helder Camara, entregue hoje, 21, no Senado Federal, a pessoas que se destacaram na defesa dos Direitos Humanos.
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Dom Edmilson, que teve seu nome indicado pelo senador Inácio Arruda (CE), disse que receber a Comenda seria “um desrespeito aos direitos humanos do contribuinte” por causa do aumento de 61% do salário que os parlamentares se deram na semana passada.
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“A condecoração hoje outorgada não representa a pessoa do cearense maior que foi Dom Helder Camara. Desfigura-a, porém. Sem ressentimentos e agindo por amor e por respeito a todos os Senhores e Senhoras, pelos quais oro todos os dias, só me resta uma atitude: recusá-la!”,
disse o bispo.
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Para dom Edmilson, o aumento do salário recebido pelos parlamentares deveria ser na mesma proporção do aumento do salário mínimo e do aposentado.
“O aumento a ser ajustado deveria guardar sempre a mesma proporção que o aumento do salário mínimo e da aposentadoria. Isto não acontece. O que acontece, repito, é um atentado contra os Direitos Humanos do nosso povo”.
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Além de dom Edmilson, foram condecorados
o bispo emérito de São Felix do Araguaia (MT), dom Pedro Casaldáliga;
os defensores públicos, Wagner de La Torre e Antônio Roberto Cardoso e
o deputado estadual do Rio de Janeiro, Marcelo Freixo.
A escolha dos nomes foi feita pelo Conselho da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara, e pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal (CDH).

Ter, 21 de Dezembro de 2010 18:23 CNBB

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

E AGORA, BRASIL?


E AGORA, BRASIL?
Fábio Konder Comparato



A Corte Interamericana de Direitos Humanos acaba de decidir que o Brasil descumpriu duas vezes a Convenção Americana de Direitos Humanos. Em primeiro lugar, por não haver processado e julgado os autores dos crimes de homicídio e ocultação de cadáver de mais 60 pessoas, na chamada Guerrilha do Araguaia. Em segundo lugar, pelo fato de o nosso Supremo Tribunal Federal haver interpretado a lei de anistia de 1979 como tendo apagado os crimes de homicídio, tortura e estupro de oponentes políticos, a maior parte deles quando já presos pelas autoridades policiais e militares.
O Estado brasileiro foi, em conseqüência, condenado a indenizar os familiares dos mortos e desaparecidos.
Além dessa condenação jurídica explícita, porém, o acórdão da Corte Interamericana de Direitos Humanos contém uma condenação moral implícita.
Com efeito, responsáveis morais por essa condenação judicial, ignominiosa para o país, foram os grupos oligárquicos que dominam a vida nacional, notadamente os empresários que apoiaram o golpe de Estado de 1964 e financiaram a articulação do sistema repressivo durante duas décadas. Foram também eles que, controlando os grandes veículos de imprensa, rádio e televisão do país, manifestaram-se a favor da anistia aos assassinos, torturadores e estupradores do regime militar. O próprio autor destas linhas, quando ousou criticar um editorial da Folha de S.Paulo, por haver afirmado que a nossa ditadura fora uma “ditabranda”, foi impunemente qualificado de “cínico e mentiroso” pelo diretor de redação do jornal.
Mas a condenação moral do veredicto pronunciado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos atingiu também, e lamentavelmente, o atual governo federal, a começar pelo seu chefe, o presidente da República.
Explico-me. A Lei Complementar nº 73, de 1993, que regulamenta a Advocacia-Geral da União, determina, em seu art. 3º, § 1º, que o Advogado-Geral da União é “submetido à direta, pessoal e imediata supervisão” do presidente da República. Pois bem, o presidente Lula deu instruções diretas, pessoais e imediatas ao então Advogado-Geral da União, hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal, para se pronunciar contra a demanda ajuizada pela OAB junto ao Supremo Tribunal Federal (argüição de descumprimento de preceito fundamental nº 153), no sentido de interpretar a lei de anistia de 1979, como não abrangente dos crimes comuns cometidos pelos agentes públicos, policiais e militares, contra os oponentes políticos ao regime militar.
Mas a condenação moral vai ainda mais além. Ela atinge, em cheio, o Supremo Tribunal Federal e a Procuradoria-Geral da República, que se pronunciaram claramente contra o sistema internacional de direitos humanos, ao qual o Brasil deve submeter-se.
E agora, Brasil?
Bem, antes de mais nada, é preciso dizer que se o nosso país não acatar a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, ele ficará como um Estado fora-da-lei no plano internacional.
E como acatar essa decisão condenatória?
Não basta pagar as indenizações determinadas pelo acórdão. É indispensável dar cumprimento ao art. 37, § 6º da Constituição Federal, que obriga o Estado, quando condenado a indenizar alguém por culpa de agente público, a promover de imediato uma ação regressiva contra o causador do dano. E isto, pela boa e simples razão de que toda indenização paga pelo Estado provém de recursos públicos, vale dizer, é feita com dinheiro do povo.
É preciso, também, tal como fizeram todos os países do Cone Sul da América Latina, resolver o problema da anistia mal concedida. Nesse particular, o futuro governo federal poderia utilizar-se do projeto de lei apresentado pela Deputada Luciana Genro à Câmara dos Deputados, dando à Lei nº 6.683 a interpretação que o Supremo Tribunal Federal recusou-se a dar: ou seja, excluindo da anistia os assassinos e torturadores de presos políticos. Tradicionalmente, a interpretação autêntica de uma lei é dada pelo próprio Poder Legislativo.
Mas, sobretudo, o que falta e sempre faltou neste país, é abrir de par em par, às novas gerações, as portas do nosso porão histórico, onde escondemos todos os horrores cometidos impunemente pelas nossas classes dirigentes; a começar pela escravidão, durante mais de três séculos, de milhões de africanos e afrodescendentes.
Viva o Povo Brasileiro!

Wagner Giron de la Torre - Defensor Público paulista é premiado pelo Senado Federal com a Comenda Direitos Humanos Dom Hélder Câmara



Veículo: DPE/SP
Data: 15/12/2010

O Defensor Público paulista Wagner Giron de la Torre, que atua em Taubaté, foi escolhido pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal como um dos cinco vencedores da Comenda de Direitos Humanos Dom Hélder Câmara. A premiação foi anunciada na terça-feira (14/12) e é destinada a personalidades que tenham oferecido contribuições relevantes à defesa de direitos humanos no Brasil.
A indicação de Wagner Giron ocorreu em reconhecimento ao trabalho realizado como membro da Defensoria Pública de São Paulo. Dentre suas atuações, destacam-se a propositura de ações civis públicas que questionam os efeitos socioambientais derivados da monocultura de eucaliptos na região do Vale do Paraíba, além de ações coletivas em prol de famílias carentes atingidas pelas fortes chuvas do início do ano em São Luiz do Paraitinga.
Para Wagner, a Comenda mostra o reconhecimento das atividades da Defensoria Pública pelo Senado Federal. “Essa comenda empresta credibilidade em âmbito feral às ações desempenhadas pelas Defensorias Públicas em prol dos direitos humanos”, disse. Para ele, o prêmio também legitima “a luta de movimentos populares contra o monocultura de eucalipto em prol de políticas ambientais”. Além de Wagner, o Defensor Público do Pará Antônio Roberto Cardoso também foi agraciado; os outros vencedores foram Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito da Igreja Católica, o cearense Dom Manuel da Cruz e o Deputado Estadual Fluminense Marcelo Freixo.
A comenda será entregue no dia 21/12, durante a última sessão do Senado Federal em 2010.

Com Informações da Agência Senado (“Senado divulga nomes dos vencedores da Comenda Dom Hélder Câmara”, 14/12)
Coordenadoria de Comunicação Social e Assessoria de Imprensa
imprensa@defensoria.sp.gov.br

Considerações sobre uma bursite.

"Pra não dizer que não falei das flores" Geraldo Vandré
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Infiltração

Bursite (Vejam no Google)
O ortopedista de quadril (existem os só de joelho, de pé, de mão e os "genéricos" que nos encaminham para os "especialistas") me alertou:
- Não há garantia de cura, mas a infiltração é um paliativo para a dor. No quadril só pode ser feita no hospital com anestesia geral, pois a sra. não iria suportar a dor. O ambiente deve ser completamente asséptico e com monitoramento radiológico.
- Fico internada?
- Um dia, sai no dia seguinte. A sra. terá que fazer que fazer um jejum absoluto, nem água, nem remédio à partir das 22 horas do dia anterior. Antes terá que fazer uma entrevista com um anestesista.
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Entrevista com o anestesista
- A Sra. tem alergias?- Não que eu saiba.
- É diabética?- Não.
- Usa prótese móvel?- Não.
- Tem pressão alta?- Não.
- Toma medicação de uso contínuo?- Sim, Triseqüens.
Passei no teste.
Diferente do que tinha me dito o ortopedista, ele indicou uma analgesia e em seguida uma anestesia raquidiana.
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A infiltração
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Eu e o Ode chegamos às 8:30 no hospital, como tinha sido prescrito para a micro-cirurgia que seria às 10 horas.(Micro-cirurgia - conforme fui informada - é qualquer procedimento invasivo).
O Ode ficou 40 minutos preenchendo formulários e respondendo questionários enquanto eu esperava.
A Ana chegou, toda animada, como sempre:
- Ufa! Acertei o caminho e não levei nenhum tombo!
Fomos para uma suíte belíssima que o Ode havia reservado (lembrei das que vejo nas novelas da Globo).
Meu plano de saúde cobre.
Eu estava sonolenta depois de uma noite sem dormir por causa da dor.
Quis descansar, mas a cada 5 minutos entrava uma enfermeira e me fazia o mesmo questionário feito pelo anestesista-entrevistador: - A sra. tem alergias?...etc...
Outra enfermeira me avisou para que eu não trocasse de roupa que logo viriam me buscar de maca.
Veio um rapaz educadíssimo.
Mandou eu tirar a roupa e vestir um jaleco semi-fechado atrás, que me deixava com a bunda de fora (além de não ser bonita, minha bunda é muito fria).
Ele foi me empurrando na maca e fomos conversando até chegarmos ao ambulatório.
Eu estava calma e bem humorada:
- Vou dormir e resolver em parte a minha dor, depois das duas transferências de datas da infiltração.
Para cada enfermeira que passava por mim eu perguntava:
- Não vai me perguntar se eu tenho alergia??
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Ambulatório.
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Assepsia... Parecia uma feira livre onde circulavam médicos e enfermeiras. Os pacientes eram separados por cortinas leves e dava para ouvir todas as conversas, gemidos, fofocas, tudo, menos o que eu perguntava. Para mim a resposta era sempre:
- Não sei, estou atendendo outro paciente.
Eu só tinha visto ambiente semelhante em comédias sobre atendimento hospitalar.
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Anestesista
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Chegou o tal, um jovem bonito e simpático:
- Vou lhe dar uma analgesia leve.
- Quero entender: o ortopedista disse que seria anestesia geral, o "anestesista entrevistador" disse que seria uma analgesia seguida de uma anestesia raquidiana.
- Que absurdo!! Anestesia para uma simples infiltração! Mas não se preocupe, vou lhe aplicar uma analgesia fantástica, você não vai sentir nada. Então fez um questionário alternativo:
- Você fuma maconha?
- Cheira cocaína?
- Usa exctasy?
- É alcoólica ou usuária de outra droga?
Respondi que não e que nem tinha idade para isso.
- Quantos anos você tem? Respondi.
Ele abaixou seu rosto e disse perto do meu:
- Não conte pra ninguém.
Então fez uma pergunta completamente idiota:
- Como é que você arranjou esta bursite?
A maioria das pessoas, (imaginem um médico) sabe que existem muitas causas para que uma bursa se inflame, desde impacto, até baixa resistência física.Será que alguém "arranja" uma bursite porque quer sentir dor?
Mesmo assim respondi:
- Não sei. Já tive bursite nos dois ombros e tratei com fisioterapia, essa, acho que "arranjei" dançando pole dance em um motel.
Riu, mas se mostrou interessado:
- Existe motel em Curitiba com pista de pole dance?
- Não foi aqui.
- Ah!
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Procurou uma veia no meu braço para iniciar sua analgesia fantástica.
Não pude ver se a agulha estava presa a um soro.Senti a língua pesada e pensei feliz:
- Vou dormir, enfim.
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O ortopedista.
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Repentinamente chega um homem de luvas, touca, máscara, jaleco...brancos. Só pude ver uns olhos pequenos e escuros.
- Cheguei!!!
- Quem é você? perguntei assustada e completamente lúcida. A analgesia fora pras cucuias.
Ele baixou a máscara. Vi que era o ortopedista.
Ele me perguntou:
- O que vai ser? Desculpe, em que perna vai ser a infiltração?
- Eu disse ao doutor que a dor era na perna esquerda, mas o sr. prescreveu que seria bilateral.
Na posição em que eu estava não pude observar, que no local em que o anestesista colocara a agulha no braço, eu sangrava a ponto de encharcar parte de maca.
O ortopedista iniciou a infiltração. Ele havia me dito que sem anestesia geral a dor seria insuportável. Foi, mas suportei. Eu tentava gritar de dor o mais baixo possível. Quase enlouqueci.
Ele comentou:
- Está doendo porque encontrei o lugar. (e o tal monitoramento radiológico?)
Chega o "analgesista"
- Tudo bem?
- Tudo bem? Eu senti todas as dores.
- Você dormiu.
Percebi o ortopedista apontando com os olhos o meu pulso que continuava sangrando.
Ele sumiu.Chamei-o de volta e uma enfermeira me respondeu:
- Ele foi atender outro paciente.
Terminado o procedimento. A dor era insuportável. Ouvi do ortopedista:
- Estou lhe dando alta.
- Como, doutor? O sr. me disse que eu ficaria pelo menos uma noite e iria embora no dia seguinte.
- A sra. entendeu mal, se enganou. Eu não disse isso. Os procedimentos ambulatoriais não permitem internamento.
- Doutor, por favor! Não tenho quem me cuide, minha casa é cheia de escadas. Eu reservei uma suíte, eu pago uma diária a mais.
Ele me deu um olhar como quem dá ombros:
- Não é possível, é norma do hospital.
Quem teria criado a norma de anestesia geral, descumprida?
Afastou-se rapidamente, mesmo eu dizendo que estava também com dor de cabeça. Chegou antes de mim no quarto, onde a Ana e o Ode esperavam. Deu alta e não deixou nenhuma prescrição médica ou receita.
- Minha secretária entra em contato com vocês segunda-feira.
Era sábado, meio-dia.
Foi um fim de semana de pura e absoluta dor.
O juramento de Hipócrates é uma declaração solene tradicionalmente feita por médicos por ocasião de sua formatura.
Acredita-se que o texto é de autoria de Hipócrates ou de um de seus discípulos.
"Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça (...)"
Gostaria de saber se há parentesco grego (etimológico) entre Hipócrates e Hipocrisia??

Nédier

PS:- Talvez insensibilidade seja um termo mais adequado do que hipocrisia. A sensibilidade dos profissionais de Medicina, talvez pela própria rotina, vai se neutralizando aos poucos. Seria injusto de minha parte não mencionar que uma grande parte dos médicos que tratou e trata a mim e aos meus familiares são profissionais dedicados, competententes, não mercenários, dignos e sensíveis. Vou mencionar apenas alguns, como Gerson Gebert, Abdala Sarraf, Miguel Riscalla, Gilson Yared e Sérgio Todeschi. Eu acredito que existem milhares como eles que nos dão alguma esperança de que um dia o nosso país poderá se orgulhar da saúde de nossa população, hoje tão precária.


sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Milhares por Cancún....De Fato.

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Os movimentos sociais marcaram a agenda das negociações da conferência ao realizar uma mobilização massiva nesta terça-feira (7)

08/12/2010

Vinicius Mansur
De Cancún (México)
Texto e fotos

Os movimentos sociais marcaram a agenda das negociações da COP 16 – conferência da ONU sobre mudanças climáticas – ao realizar uma mobilização massiva nas ruas de Cancún, México, nesta terça-feira (7).
Esta foi a segunda marcha organizada pela Via Campesina durante a COP 16 para pressionar a ONU a tomar medidas mais efetivas no combate ao aquecimento global.


As organizações sociais já falam em um “Cancún-hagen”, indicando que o fracasso de Copenhagen irá se repetir no México.
Apesar do alto contingente policial, a marcha de quase 10 mil pessoas transcorreu sem enfrentamentos. Além de movimentos sociais e ativistas de todo o mundo, o ato contou com a presença do embaixador da Bolívia na ONU, Pablo Solón, e com o representante do governo do Paraguai, Miguel Lovero.
A Via Campesina também impulsiona em paralelo à COP 16 uma jornada de lutas chamada de ”Milhares por Cancún”. De acordo com a organização, já foram realizadas mais de 200 ações em 37 países em protesto às nações que se negam a assumir compromissos para redução de poluentes e, por outro lado, incentivam acordos que aumentam ainda mais a mercantilização da natureza.







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Nédier

As janelas de minha mãe

Trecho de viagem de trem para Paranaguá pela Serra do Mar


"Uma pessoa que escreve sobre a vida como quem olha por uma janela não consegue vivê-la."
(Caio Fernando Abreu )

"Olhe a paisagem, tire a cara deste livro, veja a Serra do Mar toda florida.
A vida não está nos livros.
Você é até capaz de estar lendo a descrição desta paisagem e se recusa olhá-la."
(Delmarine Machado Brusamolin, minha mãe)
Resumo de palavras que ela me disse muitas vezes querendo me ensinar a viver.
Eu devia ter aprendido mais com minha mãe porque ainda prefiro o livro à paisagem.

Sou um ser urbano que desenvolveu certa implicância com alguns ecologistas que se referem à Ecologia como uma "entidade" como se nós não fizéssemos parte dela. A ecologia é um conceito de certa forma, intuitivo. Sabemos (?!) que nenhum organismo, pode existir sem interagir com outros ou mesmo com ambiente físico no qual ele se encontra.

Minha mãe, foi uma professora primária, que alfabetizava crianças e adultos.
Lecionou 37 anos quando poderia se aposentar com o salário integral aos 25 de magistério.
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O escritor, dramaturgo e jornalista nos instigava a pular, quebrar vidros, cortar-se nos cacos. Viver.
E só então escrever sobre a vida.
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Minha mãe não instigava, rompia os obstáculos. Quebrava os frágeis vidros, sangrava, torcia o pé, sofria, mancava, mas vivia.
Nunca escreveu sobre a vida.
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As janelas de minha mãe
"Olhar a paisagem é viver, lê-la, não é."
Ela ficava me repetindo frases como esta nas viagens de trem que fazíamos para Paranaguá/PR para visitar o tio Dione e a tia Zica.

A paisagem que ia se transmudando através da janela do trem era a pura diversidade da vida. Flores, quedas d’água, grotões, túneis assustadores.
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De repente uma borboleta azul pousava em uma ramagem verde. Nem uma foto, nem um quadro impressionista podem reproduzir a vida e nos fazer sentir bem acima deste mundo pequeno e mesquinho que muitas vezes abrigamos dentro de nós.

A metamorfose vai transformar uma larva asquerosa em uma etérea borboleta.
Este contraste pode nos fazer refletir que a vida é uma transformação constante - e cabe a nós - no que queremos nos transformar (a larva, descartada para que a borboleta voe, é transformada em seda)

Escrever olhando a vida pela janela e se recusar transpô-la é se auto impor um aprisionamento. É absurdo.
Lá fora nada é estático. Mas quem se recusa a transpor sua janela é porque não quer levar sustos.
Susto não é medo.
Susto é não suportar o inesperado.
Viver é um susto.
Por esta razão é mais fácil escrever sobre a vida do que vivê-la, mas escrever sobre a vida não é viver.
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Nédier

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

- Onde andará? (texto inspirado em Caio Fernando Abreu)

James Dean sob chuva em Nova York; foto é uma das mais conhecidas de Dennis Stock
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"Onde andará? é uma das expressões mais tristes que conheço. Sinônimo de se perdeu."
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"Frase de Caio Fernando Abreu, lida no excelente "Para sempre teu, Caio F..." livro de Paula Dip, baseado na vida do escritor .
O gaúcho Caio Fernando Loureiro de Abreu (12/09/1948 - 25/02/1996) foi jornalista, dramaturgo e escritor."
Apontado como um dos expoentes de sua geração. A obra de Caio Fernando Abreu, escrita num estilo econômico e bem pessoal, fala de sexo, de medo, de morte e, principalmente, de angustiante solidão.
- Onde andará? Esta pergunta me inspirou escrever o texto abaixo.
,--,...
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Onde Andará??
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Cruzamo-nos na rua. Percebi que estava sóbrio, nos olhamos com indiferença.
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Quando eu ando pela cidade, as pessoas que passam por mim são seres assexuados e monocromáticos. São impessoas, já que existe a palavra impessoal.
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- Onde andará? Pensei ao vê-lo se afastar. Conclui, como quem conjuga um verbo composto, me perdi, se perdeu, nos perdemos...
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Depois da colisão inesperada em um cruzamento, atingidos pelos ferros quentes e retorcidos da paixão, cada um de nós seguiu seu rumo. Doidos, doídos, sangrando. Agonizantes.
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- Sobrevivemos - constatei - e nesta sobrevida continuamos carregando, inutilmente, emoções envelhecidas nos corpos envelhecentes.
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Nédier