sexta-feira, 30 de março de 2007

Para o Marcelo Ferrari

Marcelo,

O teu lindo texto - O Pão Nosso de Cada Dia ::: (sobre onipresença) - além de me reconfortar, teve mais um mérito: para eu poder comentá-lo, acabei abrindo este blogger.
Custei a aprender lidar com ele.
Para treinar, postei poesias, crônicas, fotos, textos antigos. Valeram horas de puro prazer pra quem estava se sentindo tão nada, enfurnada em minha toca feito um bicho.

Ontem fui me despedir da Luci, minha amiga da infância, mais que uma irmã. Nós crescemos tão juntas que era como se fôssemos uma pessoa só.
Ela criou cinco filhos bonitos e equilibrados. Era boa esposa e mãe mas, debaixo da aparência de uma simples dona de casa, vivia uma artesã criativa, uma artista que pintava belos quadros.
Não ficou doente, foi embora porque seu coração parou.

Na noite anterior à sua morte eu sonhei com ela. Pulei de pijama de flanela para a sua cama. Duas menininhas assustadas se amparando mutuamente. Como numa tarde de domingo, no fim de um jogo de futebol de várzea, quando nós duas perdemos a condução de volta (na carroceria de um caminhão) e tivemos que voltar para casa andando durante horas, pelo meio do mato, cheias de medo.
A nossa única segurança era que estávamos juntas como sempre estávamos, mãozinhas apertadas uma na outra.
(Eu sonho constantemente com ela, somos crianças ou adolescentes e estamos de mãos dadas)

Na capela funerária, aproximei-me para vê-la e gostei de sua expressão serena, parecia dormir. Quando eu olhava a minha criança morta, ali em minha frente, envolta em flores, uma outra companheira de nossa infância, sua prima Marilis, agora uma senhora tão tranqüila, chegou bem perto, me abraçou por trás e disse baixinho em meu ouvido:
- Como somos felizes! (assim no presente) Que infância maravilhosa nós
tivemos!!

Não é coincidência, é sincronicidade. O mundo, este deus onipresente e onisciente está se esforçando para que eu saia desta toca onde me escondi - há tanto tempo - como um animal que precisou hibernar para sobreviver.
E eu sobrevivi às trevas desta noite e hoje um novo dia amanheceu em mim.

Nédier
Foto:
- Eu, a Luci e seus dois primos: Odenir e Adilson. Eles foram nossos pares na quadrilha da festa junina da Igreja do Cabral. O Odenir era apenas o primo da Luci.