segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Borboleta no Chapéu - Maria Helena Bandeira



Borboleta no chapéu


Um dia quente,
feroz tormento
manto de intenso
gosmento suor
rios de escassa
supérflua mágoa
são tua paga
na solidão
Meio do dia
confesso o diabo
claro contexto
contesto e nego
e não aceito
desminto e apago
e ainda volto
solto e não solto
caminho tensa
como uma lâmina
sobre a parede
de cal e pedra
Há uma serpente
de sol e cheiros
que sobe ardente
pela janela
Quisera ser uma borboleta
quieta,
confiante,
sobre um chapéu.

maria helena bandeira
http://poemadia.blogspot.com/

Maria Helena Bandeira
Carioca, menção especial do Prêmio Guararapes da União Brasileira de Escritores (poesia).
Conto Brasileiro do Mês da Isaac Asimov Magazine, primeiro lugar do site português Simetria (mini-contos), indicada pra o prêmio Argos (2002).
Finalista do V Fest Campos de Poesia Falada e do I Festival Aberto de Poesia Falada de São Fidelis. Terceiro, quinto e sétimo lugares nos Jogos Florais Palavra e Música (Portugal)
Integrante da Oficina de Escritores (OE). Escolhida pelos leitores em Blocos uma das dez melhores (2003).
Participou da antologia portuguesa Antoloblogue, de fantástico e da antologia FC do B – panorama 2006/2007.
- E com muita alegria e honra, minha querida amiga.
Nédier

Espetáculo de sons e cores‏ - José Alberto Costa - Marco Zero,abertura do Carnaval em Recife


Naná Vasconcelos, ao lado de Caetano Veloso, comanda orquestra de batuqueiros
Fotos: Luka Santos


Espetáculo de sons e cores‏


José Alberto Costa


O tempo ajudou. Uma chuva torrencial deixava escapar a emoção de mais um carnaval. Parecia chorar maravilhado com o brilho multicor do Marco Zero. As luzes luziam com imensa intensidade. Os olhos, que eram cada janela do casario antigo do Bairro do Recife, permaneceram abertos e atentos aos milhares de movimentos lá em baixo. A sacada queria descer para dar uma sacada de perto nos arredores do centro antigo. Milhares de fantasias penetravam a noite molhada. Voluptuosas ganharam a noite, afora, adentro. Os relógios se apertavam para controlar os segundos que fugiam e saíam do seu controle. Os postes desejavam se aproximar ainda mais daquele encontro de maracatus. Dezesseis nações de maracatus rompiam a noite com seus ensurdecedores batuques. As alfaias tremiam ao roçar das baquetas pesadas. Abês e agogôs cantavam sons de África, sons de um Brasil multirracial. Amalgamados, os conjuntos dissipavam a noite chuvosa. Atento, o grande obelisco se esticava para participar do evento. O velho porto sorria com a posição privilegiada que tinha naquele evento monumental. Espalhava-se pelos lados, derretido de amores pelo carnaval. Microfones, instrumentos musicais, cobriam o palco, amarrados de paixão por centenas de fios eletrizados. O conjunto de luzes substituía as estrelas que choravam por cima de densas nuvens que tapavam suas visões. Os personagens: tubarão, porco, fantasias, dançavam aos sons da pesada percussão. Alfaias, agogôs, caixas, abês, fizeram a abertura do Carnaval Multicultural do Recife. Os fogos de artifício aplaudiram o marco inicial de uma festa sem par. Festa que se explica por si só, onde as lágrimas de alegria importam mais do que o simples relato de um observador apaixonado.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Carnaval desengano ou Menina vai,com jeito vai se não um dia a casa cai...

Foto do meu neto João, tirada pela Cláudia, sua mãe, no carnaval da escola deste ano

"Quanto riso oh quanta alegria
Mais de mil palhaços no salão..."
Máscara Negra, Zé Keti-Pereira Mattos, 1966


É domingo de Carnaval. Um dia quente, abafado, cheio de preguiça.
Em Caiobá domingo é o dia em que o carnaval é “oficial”. Vem gente de todos os balneários vizinhos para ir atrás dos trios elétricos, sobre os carros de som que passam na Avenida Atlântica, na beira da praia.
É tradição chover nesta noite.
Uma amiga que mora no norte do Estado, portanto bem longe do litoral , adora o Carnaval em Caiobá porque: “ é aquele marzão de um lado e a chuva caindo em nossas cabeças, a gente dança e não cansa”
- Deus que a abençoe!!

Além de estar com o pé “destroncado” como dizíamos no Ahu, eu tenho sido obrigada, desde sexta-feira, ouvir os carros de som poluindo o ar com o axé music, que detesto, mas com o qual já estava me acostumando por ser inevitável.
Agora, além do Axé , um barulho indescifrável “mais alto se “alevanta”. Com certeza não é música, não tem nenhum ritmo, é uma repetição hipnótica de um mesmo som, que ontem quase me levou à loucura.
Miinha filha traduziu para mim: é o som eletrônico das raves (tuchi, tuchi, tuchi...)

Nunca fui saudosista, mas o carnaval está me obrigando !
Para acalmar meu coração que sente falta de um carnaval que acabou, lembrei de algumas lindas marchinhas que eu cantava nos bailes que eram feitos em salões de clubes,muitas, eu aprendi com meus pais.
Vou transcrever o início de algumas, talvez alguém de vocês lembre.
Nédier

TA-HÍ!
Taí eu fiz tudo pra você gostar de mim
Ai meu bem não faz assim comigo não
Você tem você tem que me dar seu coração
(Joubert de Carvalho, 1930)

PASTORINHAS
A estrela d'alva no céu desponta
E a lua anda tonta com tamanho esplendor
E as pastorinhas pra consolo da lua
Vão cantando na rua lindos versos de amor
(Noel Rosa-Braguinha, 1934)


QUEM SABE, SABE
Quem sabe, sabe
Conhece bem
Como é gostoso
Gostar de alguém
(Jota Sandoval-Carvalhinho, 1955)


VAI COM JEITO
Vai com jeito vai
Se não um dia a casa cai (menina)
(Braguinha, 1956)


BANDEIRA BRANCA
Bandeira branca amor
Não posso mais
Pela saudade que me invade
Eu peço paz
(Max Nunes-Laércio Alves, 1969)
.
SONHO DE UM CARNAVAL
Carnaval, desengano
Deixei a dor em casa me esperando
E brinquei e gritei e fui vestido de rei
Quarta-feira sempre desce o pano
Chico Buarque/1965


CHUVA SUOR E CERVEJA
Não se perca de mim
Não se esqueça de mim
Não desapareça
A chuva tá caindo
E quando a chuva começa
Eu acabo de perder a cabeça
Não saia do meu lado
Segure o meu pierrô molhado
E vamos embolar Ladeira abaixo
Acho que a chuva
Ajuda a gente a se ver
Venha veja deixa beija seja
O que Deus quiser
A gente se embala, se embola
Se enrola, só pára
Na porta da igreja
A gente se olha
Se beija, se molha
De chuva suor e cerveja
(Caetano Veloso, 1971)

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Dorothi Stang - Impunidade aos assassinos no campo



Dorothy Stang.
"Nenhum dos condenados por serem mandantes de crime cumpre pena até hoje".
Entrevista especial com José Batista Gonçalves Afonso


Em 40 anos, mais de 800 pessoas foram assassinadas no Estado do Pará por seu comprometimento com a luta pelos direitos humanos.
De todos os criminosos envolvidos – geralmente fazendeiros –, somente sete mandantes foram levados a júri popular. E apenas seis foram condenados. O outro foi absolvido. Justamente o que
mandou matar a Irmã Dorothy Stang.

Nesta entrevista concedida por telefone à IHU On-Line, um dos advogados de acusação do Caso Dorothy, que condenou os pistoleiros e um dos mandantes do assassinato da missionária anglobrasileira,
José Batista Gonçalves Afonso apresenta detalhes do processo judicial dos cinco envolvidos no crime, ocorrido em 2005.

Teólogo e membro da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), José Batista trabalha desde 1996 junto à Comissão na diocese de Marabá, sudeste do Pará, e recebeu, no ano passado, o Prêmio João Canuto, do Movimento Humanos Direitos.
Para ele, “a impunidade tem sido a marca principal da atuação do poder judiciário” em relação aos casos de crimes no campo contra lideranças sociais. “Levar um mandante de crime ao banco dos réus, condená-lo e mantê-lo preso tem sido uma tarefa extremamente difícil”, assume.

José Batista Gonçalves Afonso, formado em Direito pela Universidade Federal do Pará, também é um dos articuladores nacionais da Rede Nacional dos Advogados Populares (Renap) e compõe a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pará. Atualmente, advoga também em causas de trabalhadores ligados a 16 Sindicatos de Trabalhadores Rurais, à Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri), ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e ao Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).
Confira a entrevista.

IHU On-Line – Após
quatro anos da morte de Dorothy Stang, como o senhor avalia o processo para incriminar os responsáveis pelo assassinato?
"A luta pela justiça é uma bandeira universal. E ela é necessária para poder coibir todas as situações de violência que nós presenciamos"

José Batista Gonçalves Afonso
O processo que apura o assassinato da missionária
Dorothy Stang, comparado com outros processos que também apuram assassinatos no campo no Estado do Pará, teve uma tramitação célere. Em um período de quatro anos, conseguimos levar a júri popular e condenar o pistoleiro [Rayfran das Neves Sales] e seu comparsa [Clodoaldo Carlos Batista], o intermediário do crime [Amair Feijoli da Cunha] e um dos acusados de ser mandante [Vitalmiro de Bastos Moura], restando ainda ir ao banco dos réus o segundo acusado de ser mandante do crime [Regivaldo Pereira Galvão].
Comparado às dezenas de outros processos que temos no Estado – mais de 800 assassinatos nos últimos 40 anos –, houve de fato celeridade. Temos casos aqui de assassinatos emblemáticos que os júris só ocorreram após 15, 20 anos da data do homicídio. E essa celeridade ainda não é ideal. O ideal seria, em um ano de prazo máximo, concluir o processo e levar a júri todos os responsáveis. Mesmo assim, só se teve essa celeridade por ter sido um crime que teve repercussão nacional e internacional muito grande, devido ao fato de a Ir. Dorothy ser uma pessoa muito conhecida, já ter uma atuação de muitos anos no Estado do Pará, na Amazônia, e por ter levantado uma bandeira muito sensível aos direitos humanos, à questão nacional ligada ao meio ambiente, que é a questão da defesa dos trabalhadores e a defesa do meio ambiente no que se refere à proteção da Floresta Amazônica.

IHU On-Line – Os fazendeiros Regivaldo Galvão, o Taradão, e Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, são acusados de serem os mandantes do crime. Já os pistoleiros que confessaram ter matado a freira são Rayfran das Neves Sales, Clodoaldo Carlos Batista e Amair Feijoli da Cunha, que é acusado de ser o intermediário. Qual é a atual situação judicial de cada um deles?

José Batista Gonçalves Afonso
O acusado de ser o executor,
Rayfran das Neves Sales, foi a júri popular e foi condenado, no primeiro júri, a 27 anos de prisão. Depois, foi a júri pela segunda vez, e a sentença foi confirmada também em 27 anos de prisão. Ele está cumprindo pena. O segundo acusado, Clodoaldo Carlos Batista, também foi a júri e sentenciado a uma pena de 17 anos de prisão. A mesma pena também recebeu o terceiro acusado, conhecido como Tato [Amair Feijoli da Cunha]. Os três cumprem pena na Penitenciária de Belém.
"A morte desses companheiros e companheiras tem dado mais força aos movimentos sociais, que continuam lutando em defesa da Amazônia e dos povos que a habitam"
Esses dois últimos condenados, o Tato e o Clodoaldo, já foram beneficiados com o sistema semiaberto, em razão de que a Lei de Execução Penal brasileira, na legislação anterior, prevê que o apenado, cumprido 1/6 da pena, já tem direito ao regime semiaberto.
O primeiro acusado de ser o mandante,
Vitalmiro Bastos de Moura, foi a júri na primeira vez, condenado a 30 anos. Foi a júri pela segunda vez e, infelizmente, foi absolvido, surpreendendo a todos nós e também à sociedade nacional e internacional que acompanhava atentamente o caso.
Esse é um reflexo da dificuldade que nós temos, no Estado do Pará, de condenar e manter presos os mandantes de crimes no campo. Para se ter uma noção, dos mais de 800 assassinatos no campo no Estado do Pará nas últimas décadas, nós só conseguimos levar a júri popular sete mandantes de crimes. Destes, seis foram condenados, mas nenhum cumpre pena até hoje, pois todos aguardam recurso em liberdade ou estão foragidos. E um absolvido, que foi o Vitalmiro Bastos de Moura.
No caso da Ir. Dorothy, o júri do último acusado de ser mandante, o
Regivaldo Pereira Galvão, deve ser marcado certamente ainda para este ano.

IHU On-Line – Qual o significado do
habeas corpus concedido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, a Regivaldo Pereira Galvão devido à suspeita de tentar se apropriar da terra pública cuja disputa culminou na morte a tiros da religiosa? O que isso pode modificar em seu processo criminal?

José Batista Gonçalves Afonso
Ele já estava em liberdade, conseguida por meio de um habeas corpus deferido pelo Supremo Tribunal Federal há cerca de um ano, logo após ter sido preso dias depois do assassinato da missionária Dorothy Stang. Ele chegou a passar mais de um ano preso e foi beneficiado por decisão de habeas corpus do Supremo Tribunal Federal e estava respondendo o processo em liberdade.
Essa segunda prisão, ocorrida em 26 de dezembro do ano passado, se deu em razão do Ministério Público Federal ter investigado o Sr. Regivaldo e ter conseguido provar que ele estava cometendo crime de grilagem de terra pública e de falsificação de documento público. Em razão disso, foi pedida a prisão preventiva dele, que foi decretada, e ele passou quase dois meses preso e foi beneficiado, na semana passada, por decisão do Tribunal Regional Federal, em Brasília, que o colocou novamente em liberdade da acusação do crime de grilagem de terra pública e de falsificação de documento público.
"Mesmo que aqueles que são responsáveis por fazer justiça não atuem, nós não podemos desistir de exigir que a justiça, de fato, seja feita. E essa tem que ser uma luta permanente"

IHU On-Line – Qual a avaliação da
audiência, no dia 12, dia do assassinato da Ir. Dorothy Stang, com o presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, o Desembargador Rômulo Nunes?

José Batista Gonçalves Afonso
Eu não estive presente, mas a acompanhei, pois havia um advogado da Pastoral da Terra acompanhando a audiência lá em Belém. Uma das principais reivindicações levadas pelo
Comitê Dorothy, juntamente com outras entidades que estiveram presentes na audiência, era a agilidade na realização do julgamento do recurso contra a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura. Ou seja, é preciso que o Tribunal decida essa questão rapidamente. Esperamos que ele anule o segundo julgamento, e então possamos levá-lo novamente ao banco dos réus e, com as provas existentes nos autos, conseguir novamente a sua condenação. E a segunda questão era, justamente, exigir do Tribunal maior celeridade no caso do Regivaldo Pereira Galvão, para que fosse, então, realizado o seu julgamento.
Nos dois casos, houve compromisso do Tribunal, no sentido de dar celeridade às solicitações. No caso do Regivaldo, isso deve demorar ainda um pouco, em razão de que o processo ainda está na comarca do interior do Pará, na cidade de Pacajá, próximo de Anapu, onde ocorreu o homicídio da missionária Dorothy Stang. Precisamos ainda ingressar com um pedido de desaforamento do processo dessa comarca de Pacajá para a comarca da capital, onde deverá se realizar o júri, a exemplo dos júris que já ocorreram em relação aos acusados que foram julgados no mesmo caso.

IHU On-Line – Como o senhor analisa a atuação dos poderes Executivo nacional e local, assim como do Judiciário brasileiro a partir do Caso Stang, com relação às questões de justiça social, como a reforma agrária e a defesa dos direitos humanos?

José Batista Gonçalves Afonso
O que podemos dizer com relação aos crimes do campo, que têm ocorrido em um número bastante grande nas últimas décadas devido à disputa pela posse da terra – porque de um lado estão os trabalhadores rurais sem terra e, de outro, grandes proprietários de terra, grileiros de terras públicas, madeireiros – é que a impunidade tem sido a marca principal da atuação do poder judiciário em relação a esses crimes. Isso porque, geralmente, os crimes envolvem pessoas que têm alto poder aquisitivo e também têm influências políticas no governo e fora dele. Isso tem dificultado muito a responsabilização principalmente dos mandantes de crimes. Levar um mandante de crime ao banco dos réus, condená-lo e mantê-lo preso tem sido uma tarefa extremamente difícil, não só no Estado do Pará, mas também em outros Estados. E isso reflete uma tendência muito conservadora do Poder Judiciário em relação ao enfrentamento dessa questão e também uma morosidade muito grande da Justiça no que se refere à conclusão dos processos.
"Quando Chico Mendes foi assassinado, ele também estava sob proteção policial. Então essa medida em si não resolve o problema"
Por outro lado, a Comissão Pastoral da Terra tem monitorado anualmente os conflitos no campo, e os índices de violação dos direitos humanos no campo são ainda muito graves. E nós não temos percebido um esforço do governo federal e estadual no sentido de dar celeridade à questão da reforma agrária. Até porque abandonaram essa política, e deixam os trabalhadores debaixo da lona, abandonados à própria sorte. E o governo só faz alguma coisa quando ocorrem os conflitos, para tentar minimizar a situação. Então, isso acaba agravando ainda mais a situação de violação dos direitos humanos no campo, e esse é um aspecto negativo do atual governo.

IHU On-Line – Qual é a perspectiva que se abre a partir das decisões judiciais do Caso Dorothy aos milhares de outros defensores dos direitos humanos do Brasil, como os
três bispos ameaçados de morte e demais lideranças?

José Batista Gonçalves Afonso
O Pará é o Estado campeão não só de assassinatos no campo, mas também de pessoas ameaçadas de morte. As principais lideranças dos movimentos sociais e também de Igrejas, padres, bispos, sindicalistas do Estado do Pará estão ou com proteção policial 24 horas por dia ou com pedido de proteção. Esse é um exemplo claro da força que têm os grupos que comandam o crime no campo no Estado do Pará, ou seja, encurralam o próprio Estado para que este tenha que colocar seu efetivo policial para proteger lideranças, senão elas são mortas.
Essa medida [da proteção policial] é positiva, mas ela, em si, não resolve o problema. Nós temos dito e exigido do governo do Estado que invista na apuração das ameaças. É preciso que sejam desmontadas as organizações criminosas que atuam no campo, que comandam a indústria da pistolagem no Estado do Pará e a indústria da grilagem das terras públicas, dos crimes ambientais etc. Temos que desmontar essas quadrilhas. E o governo não faz isso. Acaba atuando apenas com medidas paliativas, ou seja, ameaça naqueles casos mais graves e coloca os policiais para proteger.
Quando
Chico Mendes foi assassinado, ele também estava sob proteção policial. Então, essa medida em si não resolve o problema. É preciso que o Estado decida enfrentar os grupos organizados que comandam não só as ameaças, mas também os assassinatos no campo, além dos crimes ambientais e a grilagem de terra pública na Amazônia.
"Nós temos exigido que o governo do Estado invista na apuração das ameaças. É preciso que sejam desmontadas as organizações criminosas que atuam no campo"

IHU On-Line – Como coordenador nacional da Comissão Pastoral da Terra, como o senhor avalia o legado da luta da Ir. Dorothy contra o latifúndio, a monocultura, a escravidão e a devastação da Amazônia?

José Batista Gonçalves Afonso
– A Ir. Dorothy, durante toda a sua vida, abraçou essa causa. Deu a sua vida em defesa dos povos da Floresta Amazônica. E, claro, além dela, muitos outros combatentes, militantes e ecologistas também já deram suas vidas em defesa dos trabalhadores e do meio ambiente nessa grande região da Amazônia. Por exemplo,
Chico Mendes [1],
Ir. Adelaide [Molinari] [3],
Dezinho [José Dutra da Costa] [4],
João Canuto [5],
e muitos outros, muito conhecidos, que foram assassinados, foram tombados nessa luta. Isso, é claro, é uma perda irreparável, mas a morte desses companheiros e companheiras tem dado mais força ainda aos movimentos sociais, que continuam lutando em defesa da Amazônia, em defesa dos povos que a habitam e contra o avanço da monocultura da soja ou de outras monoculturas, como a da cana-de-açúcar sobre a Amazônia, a expansão dos projetos de mineração, que acabam tendo uma relação predatória com a floresta e com o meio ambiente, e tantas outras ofensivas como a da pecuária, da madeira, que têm causado tantos estragos para essa grande região amazônica. Isso, sem dúvida nenhuma, em vez de empobrecer ou esmorecer a luta dos trabalhadores, pelo contrário, fortalece e mantém cada vez mais viva a disposição dos movimentos sociais e das lideranças em continuar fazendo a luta em defesa da Floresta Amazônica e dos povos.

IHU On-Line – Para o senhor, que tem acompanhado todas essas lutas pela justiça daqueles que trabalham pela defesa da Amazônia, ainda é possível acreditar que a Justiça vencerá?

José Batista Gonçalves Afonso
Nós não podemos deixar de acreditar na justiça. Mesmo que aqueles que são responsáveis por administrá-la e por fazê-la acontecer não atuem a contento, nós não podemos desistir de exigir que a justiça, de fato, seja feita. E essa tem que ser uma luta permanente nossa. Para isso, temos que estar fazendo permanentemente as nossas denúncias, exigindo mudanças de comportamento e de posição do Poder Judiciário, do Poder Executivo e do Poder Legislativo.
A luta pela justiça é uma bandeira universal. E ela é necessária para poder coibir todas as situações de violência que nós presenciamos, não só contra os trabalhadores rurais e contra o meio ambiente, mas também contra todos os pobres deste país.

Notas:
Chico Mendes
1. Francisco Alves Mendes Filho, mais conhecido como Chico Mendes, foi um seringueiro, sindicalista e ativista ambiental brasileiro. Sua intensa luta pela preservação da Amazônia o tornou conhecido internacionalmente e foi a causa de seu assassinato, em 1988, exatamente uma semana após completar 44 anos, Chico Mendes foi assassinado com tiros de escopeta no peito na porta dos fundos de sua casa, na frente da mulher e dos filhos. Chico anunciou que seria morto em função de sua intensa luta pela preservação da Amazônia e buscou proteção, mas autoridades e a imprensa não deram atenção.
Pe.Josino Tavares
2. Então coordenador da Pastoral da Terra, foi assasinado em 1986 por seu apoio ao agricultores em conflito com fazendeiros.
Irmã Adelaide Molinari
3. Gaúcha de Garibaldi, a irmã das Filhas do Amor Divino, trabalhava nas Missões no Pará. Em 1985, o delegado do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabá, Arnaldo Delcidio Ferreira, alvo de ameaças de morte, foi ao encontro de Ir. Adelaide na rodoviária de Eldorado. Enquanto conversavam, um pistoleiro disparou contra Arnaldo. A bala atravessou o tórax de Arnaldo e atingiu a irmã no pescoço, que não resistiu e morreu.
Dezinho, José Dutra da Costa
4. Em 2000, após oito anos de ameaças, José Dutra da Costa, o Dezinho, como era chamado, secretário de Política Agrária do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, foi assassinado em frente à sua esposa e filhas. O motivo estaria em sua luta por um projeto de assentamento para o seu município, onde grandes áreas de terras estavam sendo desocupadas para a pecuária.
João Canuto
5. João Canuto, pai de família, tornou-se o principal líder sindical da região Sul do Pará. Fundou o Sindicato dos Trabalhadores de Rio Maria, foi candidato a prefeito e lutou pela classe dos camponeses. Foi preso sem ordem judicial e constantemente era perseguido por jagunços e policiais. Em 1985, ao voltar para casa, foi assassinado. Seus filhos deram continuidade à luta sindical, sendo também ameaçados várias vezes. Em 1990, José, Orlando e Paulo, filhos de Canuto, foram seqüestrados. José e Paulo foram assassinados barbaramente na estrada. Orlando conseguiu fugir baleado com várias perfurações no corpo.
(Reportagem de Moisés Sbardelotto)


quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Outro tipo de mulher nua...Martha Medeiros

Outro tipo de mulher nua...

Depois da invenção do photoshop, até a mais insignificante das criaturas vira uma deusa, basta uns retoquezinhos, aqui e ali. Nunca vi tanta mulher nua.
Os sites da internet renovam semanalmente seu estoque de gatas vertiginosas.
O que não falta é candidata para tirar a roupa. Dá uma grana boa.
E o namorado apóia, o pai fica orgulhoso, a mãe acha um acontecimento, as amigas invejam, então pudor pra quê?
Não sei se os homens estão radiantes com esta multiplicação de peitos e bundas. Infelizes não devem estar, mas duvido que algo que se tornou tão banal ainda enfeitice os que têm mais de 14 anos.Talvez a verdadeira excitação esteja, hoje, em ver uma mulher se despir de verdade... Emocionalmente.
Nudez pode ter um significado diferente e muito mais intenso.
É assistir a uma mulher desabotoar suas fantasias, suas dores, sua história.
É erótico uma mulher que sorri, que chora, que vacila, que fica linda sendo sincera, que fica uma delícia sendo divertida, que deixa qualquer um maluco sendo inteligente.
Uma mulher que diz o que pensa, o que sente e o que pretende, sem meias-verdades, sem esconder seus pequenos defeitos.
Aliás, deveríamos nos orgulhar de nossas falhas, é o que nos torna humanas, e não bonecas de porcelana.Arrebatador é assistir ao desnudamento de uma mulher em que sempre se poderá confiar, mesmo que vire ex, mesmo que saiba demais.
Pouco tempo atrás, posar nua ainda era uma excentricidade das artistas, lembro que se esperava com ansiedade a revista que traria um ensaio de Dina Sfat, por exemplo.- pra citar uma mulher que sempre teve mais o que mostrar além do próprio corpo.
Mas agora não há mais charme nem suspense, estamos na era das mulheres coisificadas, que posam nuas porque consideram um degrau na carreira. Até é. Na maioria das vezes, rumo à decadência. Escadas servem para descer também.
Não é fácil tirar a roupa e ficar pendurada numa banca de jornal, mas, difícil por difícil, também é complicado abrir mão de pudores verbais, expor nossos segredos e insanidades, revelar nosso interior.
Mas é o que devemos continuar fazendo.
Despir nossa alma e mostrar pra valer quem somos, o que trazemos por dentro. Não conheço strip-tease mais sedutor.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Cecília Meireles

in “ Cânticos ”
.
“ Tu tens um medo :
Acabar.

Não vês que acabas todo dia .

Que morres no amor .
Na tristeza .
Na dúvida .
No desejo .

Que te renovas todo dia .
No amor .
Na tristeza .
Na dúvida .
No desejo .

Que és sempre outro .
Que és sempre o mesmo .
Que morrerás por idades imensas .
Até não teres medo de morrer .

E então serás eterno .”
.
Cecília Meireles
.
- Esta página é dedicada à querida Marisa Giglio que me manda poesias como esta, lindamente formatadas em pps.
Nédier


sábado, 14 de fevereiro de 2009

A solidão do Horto

Horto das Oliveiras

As feras estão insones
Tigres espreitam a certeza
do sangue fresco.

Quieto, irmão,
esta é a hora da agonia.


L. A. Damous


A solidão do Horto

Quando o chefe lhe deu a missão, Emanuel aceitou mesmo sabendo que seria impossível levá-la a termo.
Teve a permissão de formar um grupo de homens para ajudá-lo. Conseguiu reunir pessoas simples: - pescadores, desempregados, trabalhadores explorados e outros que se impressionaram com Emanuel porque ele pretendia alterar os rumos da sociedade que os ignorava.

Juntos andavam por lugares impróprios, com pessoas impróprias como pobres, ladrões e prostitutas.
Eram elogiados e difamados como acontece com todos aqueles que agem sem se preocupar com a Lei e a formalidade.
À classe média e aos ricos provocavam medo de mudanças, mas os pobres, na falta de outras opções, aceitavam as palavras de Emanuel.
A caridade, tema principal de seus discursos começou a provocar “milagres”, se é que se pode considerar milagre centenas de pessoas ficarem envergonhadas de seu egoísmo. Elas abriam seus bornais e repartiam a comida que haviam trazido para as reuniões que Emanuel fazia ao ar livre, nos campos, em pequenas montanhas, sob o sol ou na sombra dos arvoredos. E onde, aparentemente, não havia comida alguma, sobravam cestos de pão.

Além de ser conhecido, Emanuel começou ser aclamado pelo povo sempre sedento de benesses.
Os homens adoram receber sem precisar dar nada em troca. Esta é razão de serem tão volúveis. Mudam de crenças e de amigos conforme suas conveniências pessoais.
As autoridades políticas e religiosas não podiam aceitar que aquele joão-ninguém rodeado por maltrapilhos pudesse contestar uma Ordem que haviam criado para se proteger e emitiram ordens de prisão contra Emanuel.
Não foi difícil encontrar entre os seguidores de Emanuel um, que o delatasse contando o local onde ele se escondia.
Dinheiro compra até a verdade, esta é a verdade.
Anoitecia quando Emanuel soube da traição e soube também que a polícia, mal esperaria clarear o dia para ir buscá-lo naquele horto onde ele estava com seus seguidores. Emanuel pediu a eles que lhe fizessem companhia.
- Não durmam, vigiem, fiquem acordados, não me deixem sozinho nesta espera.
Mas aqueles homens sabiam que só ele seria preso e como já estavam cansados se esconder, não resistiram ao sono.

Emanuel conhecia os métodos de tortura que seriam usados contra ele.
Teve dúvidas.
- Valeria a pena todo o sofrimento que teria de suportar?

Todos dormiam ao seu redor. O luar se esgueirava entre as oliveiras. As luzes e as sombras traçavam fantasmas de medo pelo chão.

A solidão doía mais que as visões apavorantes do dia seguinte.
Via-se em carne viva, ouvia os impropérios.
A solidão se tornou – enfim - insuportável
Desesperado, ligou de seu celular, para o Chefe, a quem chamava de Pai e disse quando foi atendido:
- Pai, afasta de mim este sofrimento, se for possível.
O Pai não respondeu, mas mandou um jovem portoriquenho conhecido como Angel para lhe fazer companhia.
De nada adiantou. A presença de Angel aumentou a sua angústia.

Percebeu assustado que suava sangue e que as gotas do seu sangue caíam na terra. Eram sementes de sua dor. Elas iriam brotar naquela terra e aquela terra jamais conheceria a Paz e trazê-la à terra era a sua principal missão.
- Tudo foi inútil – pensou - logo estarei morto e esquecido.

Resolveu acordar seus companheiros:
- Como podem dormir em uma hora desta? Levantem-se.

O dia clareava quando chegaram os policiais trazidos pelo traidor. Conforme o combinado, para apontar o homem que deveria ser preso, o traidor deveria beijá-lo. Emanuel deixou-se beijar. Sentiu piedade por aquele homem fraco que encostou os lábios no seu rosto.

E ele foi levado, açoitado, torturado e morto. Todo seu sangue havia se exaurido e rios de água brotaram de suas veias

Destino comum de infratores pobres.

Mas este pobre infrator infrinfiu as normas da Natureza e ressurgiu, mais vivo do que nunca, no coração daqueles que o abrigam.



Nédier

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Avanços e desafios do Parlamento do Mercosul

O deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR) transmite na tarde desta terça-feira (10/2) o cargo de presidente do Parlamento do Mercosul (Parlasul), que nos próximos seis meses será exercido por um parlamentar do Paraguai.

A eleição do novo presidente e a transmissão do cargo acontecem durante sessão marcada para as 15 horas, na sede do Parlasul, em Montevidéu, Uruguai. A mesma sessão também irá definir a composição da mesa diretora e os integrantes das dez comissões permanentes ao longo dos próximos dois anos.

Num relatório de 43 páginas, o deputado Dr. Rosinha faz um balanço positivo de sua gestão à frente do Parlamento do Mercosul. Iniciada em 28 de junho de 2008, quando o brasileiro tomou posse na cidade argentina de San Miguel de Tucumán, a gestão é semestral e em forma de rodízio, simultâneo à presidência executiva do bloco.

Entre os principais avanços do Parlamento nos últimos meses, Dr. Rosinha cita a aprovação, pelo Conselho do Mercado Comum —órgão máximo do Mercosul, formado pelos ministros de Relações Exteriores e de Economia—, da decisão de número 47/2008, que possibilitou a formação de um grupo de trabalho para regulamentar o inciso 12 do artigo 4º do protocolo constitutivo do Parlasul.

O item em questão trata das normas do bloco, que teriam sua tramitação agilizada dentro dos congressos nacionais após a respectiva aprovação pelo Parlamento do Mercosul. Conforme o protocolo, os parlamentos nacionais devem criar um procedimento preferencial para a tramitação das normas do bloco aprovadas pelo Parlasul. O prazo máximo de tramitação não poderá ser superior a seis meses.

Hoje, não há teto definido para a tramitação das normas relativas ao bloco nos congressos de cada país. A mensagem que trata da adesão da Venezuela ao bloco, por exemplo, tramita no Congresso brasileiro há exatos dois anos, desde fevereiro de 2007.

"A regulamentação desse dispositivo permitirá que o Parlamento do Mercosul se fortaleça e funcione de maneira ágil, além de evitar que acordos do bloco sejam engavetados pelos Legislativos nacionais", avalia Dr. Rosinha.

O parlamentar brasileiro lista ainda como aspectos positivos a maior visibilidade do parlamento, a realização de audiências públicas e a implantação de ferramentas de transparência administrativa.


Proporcionalidade

O principal desafio atual do Parlamento do Mercosul citado pelo deputado brasileiro é a aprovação dos critérios da proporcionalidade de representantes por país, medida indispensável para a eleição direta dos parlamentares do bloco.

No último mês de dezembro, durante reunião ocorrida em Salvador (BA), os ministros do bloco registraram em ata o acordo para a realização de um encontro entre a mesa diretora do parlamento e o Conselho do Mercado Comum até março deste ano, com vistas a solucionar o impasse da proporcionalidade ainda neste primeiro semestre.

Hoje, cada um dos membros permanentes do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) tem 18 representantes. Ainda em fase de adesão, a Venezuela tem nove parlamentares com direito à voz, e não a voto.

Proposta do próprio Dr. Rosinha, em tramitação no Parlasul, concede 75 cadeiras ao Brasil, 33 à Argentina, 27 à Venezuela, 18 ao Paraguai e 18 ao Uruguai.


Prestígio

Durante o mandato de Dr. Rosinha como presidente do Parlamento do Mercosul, de junho de 2008 a janeiro de 2009, foram realizadas seis sessões ordinárias, duas sessões extraordinárias e duas sessões especiais, além de audiências públicas e seminários. Nesse período, as sessões plenárias aprovaram 28 disposições, 16 declarações e 11 recomendações.

Entre os meses de agosto e novembro, o Parlasul recebeu em Montevidéu os ministros brasileiros Celso Amorim (Relações Exteriores), Nelson Jobim (Defesa) e Fernando Haddad (Educação).

"Os três ministros falaram sobre e assuntos relevantes para a região, como a presidência brasileira do bloco, a criação de um Conselho Sul-Americano de Segurança e a integração educacional na região", observa Dr. Rosinha. "A presença deles revelou o alto prestígio do Parlamento do Mercosul junto ao governo brasileiro."


Referendos na Bolívia

Outro ponto destacado pelo deputado foram as missões de observação eleitoral, realizadas durante os referendos realizados na Bolívia. A primeira delas, em agosto de 2008, no referendo revogatórios dos mandatos, foi co-presidida por Dr. Rosinha e pelo ex-vice-presidente argentino Carlos Álvarez.

A segunda, no último dia 25 de janeiro, presidida pelo parlamentar brasileiro, ocorreu durante o referendo sobre a nova constituição boliviana.

"Chamo a atenção para o fato de que, para esta segunda missão, foi celebrado um convênio de observação eleitoral entre o Mercosul e a Corte Eleitoral Nacional da Bolívia, o primeiro convênio dessa natureza em toda a história do bloco", observa Dr. Rosinha.


Ingresso da Venezuela

Para Dr. Rosinha, a entrada da Venezuela no Mercosul é uma questão "delicada e prioritária".

No último mês de dezembro, a Câmara de Deputados do Brasil aprovou o ingresso do país vizinho. No início de fevereiro, o parecer favorável de autoria de Dr. Rosinha teve sua votação adiada no Senado por duas semanas, após um pedido de vista formulado por parlamentares de oposição ao governo Lula.

"Se a União Européia fosse olhar o caráter ideológico de cada um dos governos, não teria os atuais 27 integrantes, com a perspectiva de chegar aos 30 em 2010", compara Dr. Rosinha. "Se o senador Sarney [novo presidente do Senado] tiver tempo e disposição, eu pretendo fazer um debate político com ele sobre esse assunto."
Foto em alta resolução
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(Legenda: Dr. Rosinha concede entrevista em Tucumán, Argentina, onde tomou posse como presidente do Parlasul. Crédito: Fernando Oliveira / 27.jun.2008)

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Adão Pretto, um lutador da Reforma Agrária

"Mais que parlamentar, Adão Pretto sempres foi um camponês"
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"Fica um vazio. Na vida de muita gente, na própria história . Um guerreiro não é um personagem comum. Mesmo morto continuará a sua história. Os guerreiros fazem a história. Os normais, simplesmente morrem."
Najar Tubino
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"Adão Pretto foi um exemplo de integridade e coerência. Quando ele falava, só se podia escutar e concordar, pois expressava sempre a verdade concreta vivida pelo povo do campo. E ele falava com os olhos brilhando, com a serena certeza de que era apenas porta-voz de algo muito maior: a dura história, a vida cotidiana, os sofrimentos e esperanças de todo um povo.
Adão era trabalhador, honesto, combativo e construtor do futuro como os camponeses. Alimentava as bases populares com suas idéias e projetos e estas o alimentavam com seu reconhecimento e seu terno afeto.
E Adão era poeta, fazia e declamava trovas, nas grandes assembléias e marchas camponesas, que demoliam o latifúndio, explicavam pedagogicamente as injustiças e anunciavam um mundo melhor, feito a partir das lutas dos trabalhadores e trabalhadoras, um mundo justo, um mundo pleno, um mundo sem amos."
Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos
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Homenagem dos Trabalhadores Rurais
na cerimônia do sepultamento de Adão Pretto


PERDEMOS UM GRANDE LUTADOR SOCIAL!!!


"Conheci nosso querido Adão Pretto há mais de 30 anos. Nos conhecemos numa atividade de pastoral da diocese de Frederico, onde ele era um líder de sua comunidade e ministro da eucaristia.
Frei Sergio Gorgen o apresentou fazendo muito boas referências, de que se tratava de um pequeno agricultor, lutador, honesto, trabalhador, pai de nove filhos. E que tinha muito futuro. Criava sua família com o trabalho na roça, nas costas do rio Miraguai.
Naqueles tempos de ditadura militar, era muito difícil encontrar pessoas corajosas, que se dispusessem a defender os interesses da comunidade. Desde o início o admirei por sua sensibilidade social, por sua coerência, e franqueza. Nos encontros, costumava colocar em versos singelos, as idéias que matutava e as avaliações que fazia da política.
Por sua liderança e dedicarão, foi eleito presidente do sindicato dos trabalhadores rurais do município de Miraguai, naqueles finais da década de setenta, na onda das oposições sindicais, que renovaram nosso movimento sindical.
No sindicato, dedicou-se a organizar os pequenos agricultores na luta por preços melhores, e também, com tantos sem-terra na sua base, passou a organizar o Movimento dos Sem Terra.
Logo, transformou-se numa referência política em toda região.
Lembro dele, também, da Romaria da Terra que realizamos em 1981, na encruzilhada Natalino, com nosso primeiro grande acampamento.
Adão Pretto declamou, com um filho pequeno, uma trova gauchesca denunciando as formas capitalistas de exploração dos pequenos agricultores e a necessidade da luta. Impactou a todos os mais de 25 mil participantes.
O tempo foi passando, e em 1986 organizamos a maior ocupação de terras no Rio Grande do Sul, que foi a então fazenda Annoni. Com mais de 2,5 mil famílias. E lá estava o Adão Pretto.
Naquele mesmo ano, elegeu-se deputado estadual. Seria o primeiro deputado estadual camponês a tomar posse na Assembléia Legislativa. Uma grande vitória do movimento camponês do Rio Grande do Sul.
No início muitos colunistas da imprensa burguesa riam de seu pouco estudo, afinal tinha apenas a terceira série do primário. A resposta veio numa atuação exemplar em defesa dos pequenos agricultores e sem-terra que impactou a toda sociedade gaúcha, e lhe deu o Prêmio Springer de melhor deputado.
Depois elegeu-se deputado federal, defendendo com a mesma garra e coerência na Câmara dos Deputados e no dia-a-dia os interesses da classe trabalhadora.
Adão Pretto não era o parlamentar padrão que conhecemos. Não gostava da tribuna. Mas estava presente em todas as lutas sociais que se realizaram nesses últimos vinte anos. E as fazia repercutir no parlamento, na forma de leis ou de denúncia.
Sempre o mesmo. Simples. Com uma coerência impressionante. Nunca titubeou. O critério básico que usava em sua vida e na participação política, era se perguntar: o que interessa aos trabalhadores?
E independente de tudo, os defendia.
Também deu exemplo na sua forma de fazer campanha política. Nunca aceitou receber nenhum centavo de ajuda financeira de nenhuma empresa. Por mais que seus colegas o debochavam de perder oportunidades de receber polpudas ajudas das aracruzes, Vales, e outros corruptores. Todas as campanhas foram realizadas pela militância, e em debates das idéias e de projetos.
Os trabalhadores, o povo gaúcho perde um de seus grandes lutadores sociais.
O MST e a Via Campesina perdem um de seus líderes mais coerentes e dedicados.
Todos nós perdemos.
Mas fica seu exemplo.Que certamente o imortalizará.
Grande Adão Pretto, nos deixará saudades a todos."


João Pedro Stedile - membro da coordenação nacional do MST.

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MENSAGEM DE COMPROMISSO LIDA NA DESPEDIDA NA TUMBA.

COMPANHEIRO ADÃO PRETTO
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Como soldados em terras perseguidas, trilhamos as mesmas serras e campos. sem estradas.
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Você, como o mais experiente, foi na frente abrindo as picadas e foi nos alertando dos cuidados.
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Crescemos, com o mesmo espírito, revoltado, buscando com as massas todas as soluções.
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Vencemos, tempestades e furacões, sem nunca perder de vista a utopia pendurada no horizonte.
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Bebemos, a água límpida das fontes, de nossos formadores que plantaram nas montanhas o otimismo.
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Defendemos com eles o socialismo, e todas as conquistas verdadeiramente humanitárias.
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Cerzimos as costuras da reforma agrária, em todos os recantos das belas terras brasileiras.
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Plantamos, esperanças em todas as trincheiras, sem nunca rejeitar sequer uma missão.
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Cantamos a revolução, em versos, trovas e poesias, sem nunca tropeçar na métrica das rimas.
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Cultivamos os valores e a auto-estima, procurando pôr em ordem o comportamento e a coerência.
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E, juramos com a força da consciência, de jamais se render, vender ou se deixar cooptar.
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Agora, nesta hora, no momento da partida, não queremos que seja uma despedida, mas uma continuidade.
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Continuarás presente em todos os momentos, principalmente em nossos movimentos, que se orgulham de tê-lo conhecido, como um dos filhos mais queridos, que até hoje fez nascer, a humanidade.
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(Nosso companheiro Adão Pretto foi enterrado com a cópia desse poema de Ademar Bogo, e depois cada militante depositou um um punhado de terra do assentamento SEPE TIARAJU, QUE ELE ajudou a conquistar).


Cemitério Parque da Paz, Porto Alegre, 6 de janeiro de 2009.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Baseado em fatos quase reais./sem revisão - Um conto fantástico de AroldoCorrea

A ARTE DE IR

não parte
es_vai-te.
l e n t a m e n t e . . .
Rosane
imagem: abandono os sonhos nas ruas desertas
(carla salgueiro)* abril/2006 *
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Baseado em fatos quase reais./sem revisão

Aroldo Correa


Ao entardecer raios e trovões ainda distantes anunciavam tempestade extemporânea.

Muniz encontrava-se deprimido.

Nos últimos tempos esse seu estado era recorrente. Mas, uma vez deprimido cultivava aquela situação, sentia-se bem e numa espécie de realimentação aprofundava-se cada vez mais e isso lhe fazia melhor, era aquela sensação de estado febril, quando a quietude e um agasalho quase transportam à felicidade.

Porém, naquele tarde, Muniz resolveu reagir ao mergulho e antes de ligar a tv, subiu ao banheiro do seu quarto, retirou um pequeno frasco do armário e desceu as escadas com uma dominante letargia prestes a torpor, mas estava firme,reagiria.

Passou pela cozinha, bebeu uma dose de uísque, pegou da geladeira uma garrafa pequena de água mineral magnesiana e, da mesinha da sala, o velho cachimbo já preparado.

Sentou-se na cadeira de balanço, cobriu as pernas com uma manta presenteada há tempos pela única irmã quando por uma de suas visitas cada vez mais raras.

Do pequeno frasco retirou e engoliu com um pouco da água mineral uma drágea contendo lítio, prescrito pelo psiquiatra desde o agravamento dos surtos depressivos. Em seguida, depois de várias tentativas acendeu o cachimbo. Devolveu o isqueiro à mesa, tomou o controle remoto. O celular toca. Sem verificar o número de origem, atende ao telefone com a mão esquerda e, ato reflexo, aperta simultaneamente as teclas de completar chamada do aparelho e de "on" do controle remoto da tv.

Uma luz azul néon intensa clareou aquela sala pouco iluminada durante uns vinte e cinco a trinta segundos.

O vizinho da casa emfrente estava a passear com o seu cão e, então de costas, voltou-se diante da inquietude do animal e ainda percebeu a luz azul se desvanecendo pelas frestas da janela e deu pouca importância, devia ser do isqueiro.

A vida naquela pequena rua sem trânsito era bucólica.

Os idosos que ali feneciam não a alteravam em nada por suas ausências temporárias ou permanentes.

Muniz não era idoso, apesar de aposentado do serviço público municipal, foi fiscal de posturas.


Passados vários dias, sem respostas às ligações telefônicas, Lia, a irmã, resolveu verificar e numa manhã foi até a casa que também não atendia as insistências da campainha e, diante das portas trancadas restou-lhe a ajuda dos Bombeiros.
O Soldado de um só golpe de machado pos abaixo a porta dos fundos, também trancada por dentro. Na sala quieta, sem qualquer odor diferente do esperado, Lia, logo após o Oficial Bombeiro, deparou com um cenário desconcertante e inverossímil se ali tal não testemunhasse.


A TV estava ligada, o cachimbo caído com o fumo mal queimado espalhado pelo chão frio de cerâmica, o controle remoto também no chão com a tampa e pilhas separadas.

Intactos por sobre a cadeira de balanço estavam o pijama, com sua parte superior colada ao encosto e, no assento, a manta sobre a calça cujas pernas terminavam nos chinelos de couro.


Poucas cinzas eram percebidas nos braços da cadeira, outras poucas perto dos chinelos e menos ainda sobre as roupas.

Não havia qualquer água na garrafa ou no copo e as drágeas de lítio continuavam no frasco sobre a pequena mesa.

Os Bombeiros, homens experientes submetidos a situações extremas, deixaram-se se quedar atônitos.

Lia nada falava, não ouvia, petrificada e olhar fixo, foi retirada pelo Oficial e levada para fora da casa, na qual não permitiu que alguém mais adentrasse alem do Soldado do machado.

Pelo telefone, preferiu não usar o rádio, chamou o Comandante do quartel e tentou explicar e, sem sucesso na exposição, sugeriu ao superior, logo prontificado, a comparecer só ao local da ocorrência.

Pelo caminho, em seupróprio veículo, o Comandante rebuscou na memória relatos equivalentes, porém nada lhe ocorreu além de fragmentos historiados dos mais possíveis fenômenos que muito lhe perturbaram a adolescência, entrou na casa, onde estava o Soldado do machado ainda sem encontrar o chão, seguido do Oficial.

Depois de vários e longos minutos desilêncio, o Comandante convocou o médico de plantão do quartel e, da mesma forma a preservar o episódio insólito solicitou-lhe que comparece ao local sozinho. Os três, após uma hora e meia de confabulação, concluíram manter o incidente restrito ao grupo, qualquer explicação seria insatisfatória e a ridícula repercussão, danosa e incontrolável. Precisavam que a irmã concordasse.

Lia nos fundos da casa, sentada sobre uma pedra, não respondia a qualquer estímulo.

O Médico sem dizer palavra injetou-lhe medicamento intravenoso que rapidamente lhe restituiu o ânimo e ela surpreendentemente tornou-se loquaz e racional.

Acertaram com o Médico da corporação um atestado de óbito de um cadáver por morte súbita, sem possibilidade de abertura do caixão devido aos dias decorridos. Foi cremado.
Baseado em fatos quase reais.

Aroldo.

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Escrito em 26 de agosto de 2008 para o Grupo "Conversa de Botequim"