sábado, 14 de fevereiro de 2009

A solidão do Horto

Horto das Oliveiras

As feras estão insones
Tigres espreitam a certeza
do sangue fresco.

Quieto, irmão,
esta é a hora da agonia.


L. A. Damous


A solidão do Horto

Quando o chefe lhe deu a missão, Emanuel aceitou mesmo sabendo que seria impossível levá-la a termo.
Teve a permissão de formar um grupo de homens para ajudá-lo. Conseguiu reunir pessoas simples: - pescadores, desempregados, trabalhadores explorados e outros que se impressionaram com Emanuel porque ele pretendia alterar os rumos da sociedade que os ignorava.

Juntos andavam por lugares impróprios, com pessoas impróprias como pobres, ladrões e prostitutas.
Eram elogiados e difamados como acontece com todos aqueles que agem sem se preocupar com a Lei e a formalidade.
À classe média e aos ricos provocavam medo de mudanças, mas os pobres, na falta de outras opções, aceitavam as palavras de Emanuel.
A caridade, tema principal de seus discursos começou a provocar “milagres”, se é que se pode considerar milagre centenas de pessoas ficarem envergonhadas de seu egoísmo. Elas abriam seus bornais e repartiam a comida que haviam trazido para as reuniões que Emanuel fazia ao ar livre, nos campos, em pequenas montanhas, sob o sol ou na sombra dos arvoredos. E onde, aparentemente, não havia comida alguma, sobravam cestos de pão.

Além de ser conhecido, Emanuel começou ser aclamado pelo povo sempre sedento de benesses.
Os homens adoram receber sem precisar dar nada em troca. Esta é razão de serem tão volúveis. Mudam de crenças e de amigos conforme suas conveniências pessoais.
As autoridades políticas e religiosas não podiam aceitar que aquele joão-ninguém rodeado por maltrapilhos pudesse contestar uma Ordem que haviam criado para se proteger e emitiram ordens de prisão contra Emanuel.
Não foi difícil encontrar entre os seguidores de Emanuel um, que o delatasse contando o local onde ele se escondia.
Dinheiro compra até a verdade, esta é a verdade.
Anoitecia quando Emanuel soube da traição e soube também que a polícia, mal esperaria clarear o dia para ir buscá-lo naquele horto onde ele estava com seus seguidores. Emanuel pediu a eles que lhe fizessem companhia.
- Não durmam, vigiem, fiquem acordados, não me deixem sozinho nesta espera.
Mas aqueles homens sabiam que só ele seria preso e como já estavam cansados se esconder, não resistiram ao sono.

Emanuel conhecia os métodos de tortura que seriam usados contra ele.
Teve dúvidas.
- Valeria a pena todo o sofrimento que teria de suportar?

Todos dormiam ao seu redor. O luar se esgueirava entre as oliveiras. As luzes e as sombras traçavam fantasmas de medo pelo chão.

A solidão doía mais que as visões apavorantes do dia seguinte.
Via-se em carne viva, ouvia os impropérios.
A solidão se tornou – enfim - insuportável
Desesperado, ligou de seu celular, para o Chefe, a quem chamava de Pai e disse quando foi atendido:
- Pai, afasta de mim este sofrimento, se for possível.
O Pai não respondeu, mas mandou um jovem portoriquenho conhecido como Angel para lhe fazer companhia.
De nada adiantou. A presença de Angel aumentou a sua angústia.

Percebeu assustado que suava sangue e que as gotas do seu sangue caíam na terra. Eram sementes de sua dor. Elas iriam brotar naquela terra e aquela terra jamais conheceria a Paz e trazê-la à terra era a sua principal missão.
- Tudo foi inútil – pensou - logo estarei morto e esquecido.

Resolveu acordar seus companheiros:
- Como podem dormir em uma hora desta? Levantem-se.

O dia clareava quando chegaram os policiais trazidos pelo traidor. Conforme o combinado, para apontar o homem que deveria ser preso, o traidor deveria beijá-lo. Emanuel deixou-se beijar. Sentiu piedade por aquele homem fraco que encostou os lábios no seu rosto.

E ele foi levado, açoitado, torturado e morto. Todo seu sangue havia se exaurido e rios de água brotaram de suas veias

Destino comum de infratores pobres.

Mas este pobre infrator infrinfiu as normas da Natureza e ressurgiu, mais vivo do que nunca, no coração daqueles que o abrigam.



Nédier